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sexta-feira, 2 de outubro de 2015

NASCE UMA VILA NAS RIBEIRAS DO ITAPECURU



E O RIO MOSTRA SUAS VÍSCERAS

Por: Josemar Lima                                                                          série crônicas – II/nº 22/2015
Foi no dia 20 de outubro de 1818 que a então Povoação de Itapecuru-Mirim transformou-se na Vila de Itapecuru-Mirim. Naquela época existiam aqui 138 edificações, a grande maioria casebres com paredes de taipa e cobertura de palha de babaçu, que abrigavam uma população de 767 indivíduos. Isso aconteceu faz exatamente 197 anos.
A solenidade aconteceu na Praça da Cruz, com a presença do clero, nobreza e povo. Foi levantado o pelourinho, uma coluna de pedra colocada num lugar público, onde eram punidos e expostos os criminosos.  Uma espécie de instrumento da jurisdição imperial. Foram eleitos dois juízes ordinários e um juiz de órfãos, vereadores e as oficinas na forma da lei.
Creio que alguma instituição local aproveitará o ensejo para celebrar esse importante passo que nossa povoação deu no seu processo de evolução administrativa.
Leio no Blog da amiga Jucey Santana que foi encontrado no leito do Rio Itapecuru os destroços de um Barco a Vapor e que a AICLA se mobilizou junto ao Ministério Público Estadual no sentido de que tão importante achado possa ser incorporado ao nosso patrimônio histórico, para estudos e pesquisas visando situar esse evento, não registrado em nossa história, na sua devida linha de tempo e tentar desvendar a história desse naufrágio.
Até o inicio do século XX, o rio Itapecuru era a principal via de escoamento da produção regional. Sua importância a nível estadual era grande devido ao fato de ser o canal de transporte de produtos do interior até a capital. Com a construção da estrada de ferro São Luís/Teresina, na década de vinte, paralela ao rio e posteriormente com o asfaltamento da BR-135 na década de sessenta, o rio perdeu esta função. 
A navegação a vapor nesse rio estendia-se de São Luís até Caxias. Daí por diante (trecho de pequenas corredeiras) a navegação se fazia de lanchas até Colinas.
O primeiro obstáculo à navegação da foz à nascente é a cachoeira de Vera Cruz, localizada no município de Rosário/Ma, só transposta em preamar. Daí se estendia, na baixada, uma larga zona, até Itapecuru -Mirim, francamente navegável. À montante da cidade de Itapecuru, entrava-se na zona crítica dos “secos”, que dificultava seriamente a navegação dos Barcos a Vapor.
A navegabilidade também se tornou prejudicada pela formação de bancos de areia, resultante do assoreamento que obstruía os principais canais, dificultando a passagem de embarcações de tamanho médio, principalmente no período de estiagem.
Jerônimo de Viveiros, em “A História do Comércio do Maranhão”, diz que Luís Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias, em plena Balaiada (1840), reconhecendo a necessidade da navegação fluvial para jugular a revolução, pediu à Assembleia privilégios de vinte anos à companhia que quisesse explorar a navegação. Somente em 1849, o legislativo maranhense resolveu estimular a iniciativa privada, autorizando um vultoso empréstimo sem juros a quem fizesse a navegação a vapor no Rio Itapecuru, sendo Caxias o ponto terminal da linha e Rosário, Itapecuru Mirim, Coroatá e Codó portos de escala.
Requereu a concessão a casa comercial de Domingos da Silva Porto, já a beira da falência, que importou o navio “Caxiense” de quarenta cavalos de força. Nos primeiros dias do mês de maio do ano de 1849, chegou a Rosário o navio a vapor, o gaiola "Caxiense", da Companhia de Navegação a Vapor do Maranhão, que fazia a viagem inaugural de São Luís à Caxias, iniciando assim um período de comunicação e comércio mais intenso da capital da província ao interior. Navegou apenas dois anos, e, imprestável, foi encostado.
Teixeira Mendes organizou, com as firmas Leite & Irmãos e José Pedro dos Santos & Irmão a Empresa de Navegação a Vapor dos Rios do Maranhão e firmou contrato em 1856 com o Governo da Província. 
O primeiro trecho, de São Luís a Rosário, era feito por navios de setenta a cem cavalos de força e o segundo, de Rosário a Caxias, por vapores de quarenta a cinquenta. Teixeira Mendes foi buscar na Europa o primeiro navio da Companhia, chamado “Pindaré”. 
A Companhia prosperou, e em 1870 já possuía nove vapores, sendo o de maior comprimento o chamado “Maranhão” com 176 pés e capacidade de 150 toneladas. O de maior capacidade era o Gurupi, com 156 pés de comprimento e capaz de transportar 411 toneladas. A linha costeira do Rio Itapecuru foi de longe a mais rentável em relação às outras seis linhas operadas no estado do Maranhão.
Toda a industrialização das cidades ribeirinhas no inicio do século vinte, utilizou o rio para transportar as máquinas. Vinham caldeiras, teares, roldanas, polias, prensas e todos os componentes importados da Inglaterra. Eram utilizados batelões puxados por resistentes navios gaiolas. 
Os vapores mais conhecidos foram: "São Pedro", "Rui Barbosa", "Gomes de Castro", "São Salvador", "Ipiranga", "O Maranhense", "São Paulo", "Santo Antônio", "Carlos Coelho" e "Balão". O "Gomes de Castro" foi um dos primeiros a navegar nas águas do Rio Itapecuru.
 Anos depois, o "O Maranhense" naufragou adiante do porto da Gameleira, tendo sido trazido para a cidade de Codó, uma de suas partes, pelo conceituado médico da cidade, Dr. José Anselmo de Freitas. Destino igual ao "O Maranhense” tiveram também "Carlos Coelho" que naufragou em águas do rio Mearim, e o "São Salvador", que transportara o presidente Afonso Pena, quando de sua viagem até Caxias, naufragou num lugar chamado Caixeira, no município de Rosário, anos depois. 
A navegação no Rio Itapecuru marcou uma época em nossa história, trazendo o desenvolvimento ao interior do estado. Hoje, diferente do passado, o rio é visto pela população maranhense como fonte estratégica de água, para os centros urbanos, principalmente para os moradores da Ilha de São Luís. 

Vimos, portanto, que nos tempos áureos da navegação a vapor, pelo menos onze dessas máquinas revolucionárias, cujas caldeiras eram abastecidas por lenha coletada às margens do próprio rio, navegavam por essa imensa avenida hídrica que se estendia de São Luis à Caxias, aproximadamente 500 quilômetros de hidrovia navegável.
O maior Barco a Vapor que operou no Rio Itapecuru, como vimos, foi o “Gurupi”, com capacidade de transportar 411 toneladas, correspondendo a aproximadamente à capacidade de 20 carretas a diesel, tendo comprimento de 156 pés, o equivalente a 47,5 metros.
Há, como mencionado, registros de naufrágios de pelo menos três desses navios, mas nenhum deles nas proximidades de Itapecuru Mirim, o que torna o achado ainda mais importante e merecedor de todos os cuidados na recuperação dos destroços e utensílios nele existentes. Outra hipótese é que os destroços não sejam exatamente de um Barco a Vapor, mas de um dos Batelões que eram rebocados com cargas, como se observa na foto ilustrativa.
O Rio Itapecuru, com volume d’água capaz de permitir a navegação de um Barco a Vapor com capacidade de transportar 20 carretas à diesel e engolir um desses barcos sem deixar vestígios por mais de 160 anos, hoje apresenta dificuldades para a navegação até de pequenas lanchas e deixa a mostra resquícios de suas vísceras e daquilo que era capaz de engolir sem se engasgar quando era um rio saudável e bravio.

Atualmente perdeu a função de navegação, mas continua a matar a sede de mais de um terço da população maranhense e tem como retribuição lixo e fezes empurrados goela abaixo e, ainda, a indiferença das autoridades, principalmente da CAEMA, que se abastece como um vampiro de seu sangue e não dispõe de nenhum programa de revitalização da bacia hidrográfica do venho rio. Um crime inafiançável! 

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