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quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

O VESTIDO




João Carlos Pimentel Cantanhede

Conceição era uma bela jovem de tradicional família itapecuruense, que há anos morava e estudava em São Luís. Todo ano ela ia passar férias e festas de fim de ano na casa de seus pais.
Em Itapecuru-Mirim, Conceição cultivava uma grande amizade com Rosa, amiga dos tempos de infância, que desfavorecida financeiramente, nunca pode conhecer São Luís. A viagem mais longa que ela havia feito era para o povoado Moreira, onde residiam seus avós.
Já estava se aproximando o final do ano de 1960, Conceição folheava atentamente as páginas da revista “O Cruzeiro”, quando se deparou com dois belos modelos de vestido com os seguintes dizeres: “Eis algumas sugestões para que os seus vestidos não se pareçam com os de suas amigas. ”
Olha, se tem uma coisa que mulher não suporta é encontrar alguém usando roupa igual à sua! E assim, Conceição marcou a página da revista e, naquele mesmo dia, procurou a sua costureira de confiança, pediu que lhe fizesse um vestido conforme aquele modelo, mas não comentasse com ninguém, porque segundo ela “as meninas de São Luís são invejosas. ”
Com menos de uma semana, o vestido estava pronto, ela então o guardou a “sete chaves” para que ninguém o visse e quisesse copiá-lo. Mesmo que ela só fosse usá-lo em Itapecuru não queria que aquelas enxeridas de São Luís tivessem um vestido igual ao seu.
Dias depois, Conceição estava separando algumas coisas para mandar para Rosa. Colocou um kit Cashmere Bouquet (água de colônia, pó de arroz e talco), esmalte para unhas, uma dúzia de bobes, uma caixa de grampos, brilhantina e a edição da revista “O Cruzeiro” da qual ela havia tirado o modelo para o seu vestido.
Era 23 de dezembro de 1960, quando Conceição chegou em Itapecuru-Mirim. A cidade estava tomada por aquela atmosfera natalina com várias pessoas chegadas dos interiores e também de outras cidades para compras ou para passarem o período de festas com os familiares.
Conceição, mesmo estando ainda bastante cansada da viagem de trem, nem bem chegou em casa, na Rua Urbano Santos, perto do Colégio Mariana Luz, saiu logo, foi até à Rua São Benedito visitar a sua amiga Rosa. Elas conversaram por longas horas, mas por incrível que pareça, nada falaram sobre as roupas que usariam na festa. Despediram-se e combinaram que passariam o Natal juntas na casa de Conceição.
Passada a festa de Natal, os preparativos agora eram para o réveillon. As moças estavam ansiosas pelo baile, e Conceição mais ainda, pois era a data tão aguardada para estrear o seu belo vestido. 
Na noite de 31 de dezembro, ainda cedo, ela começou a se arrumar; depois pegou um lampião Petromax, colocou ao lado do toucador e ficou se mirando no espelho por longo tempo. Quando o relógio marcou 22 horas, ela e os seus pais se dirigiram para o baile. Ao chegarem no clube, a orquestra parou de tocar para que todos pudessem apreciar aquela bela jovem, orgulho da família e de toda a cidade. O seu vestido logo chamou a atenção das mulheres presentes, principalmente as jovens.
Após essa entrada triunfal, Conceição e família sentaram-se à mesa previamente reservada. Mas conversa vai, conversa vem, ela olhava para todos os lados e nada de ver Rosa.
Quando já passava das 23 horas e a orquestra já havia tocado algumas valsas e duas polcas, finalmente Rosa chegou. A sua chegada não fez a orquestra parar, tampouco chamou a atenção das pessoas ali presentes. Porém, Conceição gelou quando viu o vestido da amiga, que se aproximava, ainda suada da longa caminhada da Rua São Benedito ao Centro da Cidade.   
Quando Rosa chegou à mesa, Conceição estava pálida. Ela havia reconhecido o vestido da amiga, era o modelo que estava ao lado do seu na página 93, da edição de 22 de outubro de 1960, da revista “O Cruzeiro”, que ela despreocupadamente havia enviado sem nunca imaginar que dali a amiga iria escolher o vestido que mandaria fazer para usar no baile.
Conceição comentou com Rosa o susto que passou ao ver o vestido dela. Rosa deu um sorriso e disse que realmente sentiu vontade de mandar fazer o outro, mas percebeu que ele estava circulado, e ao seu lado estava escrito: “ESTE!”  Isso lhe serviu de aviso e impediu que ambas usassem vestidos iguais na noite de réveillon.   

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