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domingo, 3 de janeiro de 2016

ITAPECURU MIRIM, CAPITAL DO ESTADO DO MARANHÃO???...




Por: Josemar Lima                                                                    Série de Crônicas – ano III/nº 25/2016

Pois é! O Rei de Portugal, Dom João IV, em 1648, chegou a analisar uma proposição feita pelo então governador do Maranhão, Francisco Coelho de Carvalho, referente a mudança da sede do Governo do então estado do Maranhão e Grão Pará, para a povoação de Itapecuru Mirim.

Você, caro leitor, sabia desse fato histórico? Eu também não! Vi uma informação no livro do confrade Benedito Bogea Buzar, “O Dia a Dia da História do Itapecuru-Mirim”, e sair a pesquisar inclusive junto aos arquivos do Conselho Ultramarino. Consegui informações relevantes, inclusive a data da Consulta formulada pelo referido conselho ao rei de Portugal: 25 de janeiro de 1648, além de trechos do referido documento e acesso a mapas realizados em 1632, sobre a possível localização da nova sede do governo do Maranhão.

Francisco Coelho de Carvalho foi o décimo segundo governador do estado do Maranhão, no período em que São Luis era a sede de governo do estado do Maranhão e Grão Pará. Assumiu num período em que as tensões estavam acirradas devido às pressões para uma redefinição geográfica da região, principalmente reivindicadas por Belém que não se conformava com a subordinação a São Luís.

 Seu período de governo foi curto, iniciado em 17 de junho de 1646 e encerrado em 15 de fevereiro de 1648, menos de um mês após a consulta formulada pelo Conselho Ultramarino ao Rei de Portugal. Havia também nesse período um grande temor de que esta região do norte do Brasil, diretamente vinculada à coroa portuguesa, viesse a ser tomada por potências navais estrangeiras, situação já vivida em 1612, com os franceses, e em 1641, com os holandeses.

A proposta, em forma de Carta, foi endereçada ao Rei de Portugal, mas antes de chegar ao rei, teria que passar pelo crivo do Conselho Ultramarino, vinculado à corte portuguesa.

O Conselho Ultramarino, fundado em 1642, era uma instância com status de tribunal, destinado a manifestar-se sobre todos os assuntos referentes ao estado da Índia e dos novos territórios descobertos pelo Reino de Portugal.

 A criação do estado do Maranhão e Grão Pará, com a sede administrativa em São Luis, nunca obteve consenso nem por aqui e muito menos na corte. A solicitação do Rei D.Felipe II, feita em Carta Régia de 1622, consequentemente após a instituição do estado do Maranhão e Grão Pará, em 1621, e definição da sede do governo em São Luis, para que fosse informado “em que parte das terras das conquistas do Maranhão e Pará será conveniente se escolher um sítio em que se possa fazer uma capitania e povoação que seja cabeça daquele estado e que distrito deve ter” revela uma incerteza sobre a continuidade de São Luís como sede do governo geral do estado do Maranhão e Grão Pará.

E, apesar de São Luis permanecer o centro político e administrativo, a dúvida entre as elites da terra e da corte atravessou o século XVII até a segunda metade do século XVIII. Na Consulta encaminhada ao Rei de Portugal os conselheiros afirmavam com base nas justificativas apresentadas pelo governador do Maranhão, “que aquela ilha em que a cidade está situada não é forte, sendo limitada e que as barras por onde se pode entrar nela são pouco defensáveis, pois sua largueza e falta de sítios para se fortificar”.

Contudo, mesmo com essa insegurança, o aspecto natural de São Luís agradava aos moradores da terra. Ainda na mesma consulta, os conselheiros ressaltavam esse caráter. A Ilha – diziam – “tem sítio muito sadio e saudável para a vida humana  e abundância de água e comodidade para ter provimento necessário ainda que cresça muito mais em gente pela vizinhança que tem da terra firme e por desaguarem os rios Mearim, Itapecuru e Munim”.

Todavia, o texto traz uma ressalva que pode explicitar a motivação do governador Francisco Coelho de Carvalho em optar pela povoação de Itapecuru Mirim para a nova sede de governo do estado do Maranhão: “E – continuava o relato ao monarca – sendo certo que o sítio do Itapecuru aonde o seu tio Antônio Coelho de Carvalho, no tempo em que governava aquele Estado, mandou fazer povoação e que em razão de uma cachoeira fica inexpugnável a quando poder havendo da nossa parte povo que mais nos convinha”.

É verdade que o governador teve um tio de nome Antônio Coelho de Carvalho, que governou o Maranhão no período de 3 de setembro de 1626 a 15 de setembro de 1635 e que tinha feito intervenções na região, mas o cerne da questão da transferência estava ligado à fragilidade da ilha em relação às constantes investidas estrangeiras contra as terras conquistadas por Portugal no norte do Brasil.

A cachoeira a referenciada, trata-se da Cachoeira de Vera Cruz, localizada quase na foz do Rio Itapecuru, no município de Rosário, neste estado e que já foi objeto de uma crônica desta série. Levar a sede do governo para o continente tornava-a mais segura e a região já tinha se mostrado estratégica para expulsão dos holandeses que se aventuraram a adentrar o Rio Itapecuru para expropriar os engenhos de açúcar lá localizados e se deram mal.

Há, entretanto, um estudo mais detalhado sobre uma possível transferência da sede do governo do Maranhão para a povoação de Itapecuru Mirim, atestando que a mudança da capital não era meramente de ânimo familiar, pelo vínculo do governador com um seu parente que se interessara pela região localizada nas ribeiras do Itapecuru.

No mapa atribuído a João Teixeira Albernaz, datado de 1632, encontra-se, além de representações de aldeias, rios e fortes existentes na região do Itapecuru, uma clara indicação nas margens direita do referido rio que diz: “aqui há de se fazer povoação para cabeça do Estado”. Esta localização coincide rigorosamente com a atual cidade de Itapecuru Mirim.

Não deixa de ser instigante o fato de que no período em que se aponta a região do Itapecuru como possível sede do governo local coincide com a vigência do governo de Antônio Coelho de Carvalho (1626/1635), que justamente tinha promovido a povoação da terra naqueles lados.

Concretamente, as tentativas de mudança da capital do Estado para a povoação de Itapecuru Mirim não passaram do papel, mas chagaram a merecer análise do Conselho Ultramarino e Consulta ao Rei Dom João IV de Portugal. Outra razão que deve ter contribuído para que a proposta não prosperasse foi a saída do governador Francisco Coelho de Carvalho de suas funções menos de um mês após a Consulta formulada.

Creio que o Rei nem teve tempo para responder ao requerente, no caso o então governador do estado do Maranhão e Grão Pará, Francisco Coelho de Carvalho, ou se houve pressões contrárias à proposta que motivaram sua retirada do governo logo após a consulta?

Fiz contato com o Arquivo Histórico Ultramarino de Lisboa,  o IICT, buscando cópia do parecer emitido pelo referido conselho relativo à carta formulada pelo governador do estado do Maranhão e Grão Pará ao Rei de Portugal e consegui não só o parecer, mas também os mapas oriundos do estudo técnico realizado em 1632, com a indicação precisa da povoação de Itapecuru Mirim como possível sede do governo do estado do Maranhão e Grão Pará.

Considerando os críticos e crônicos problemas econômicos, sociais, ambientais, culturais e políticos institucionais atualmente enfrentados por São Luis, capital do estado do Maranhão, tornando-a uma cidade com alto grau de insustentabilidade, acho que não perdemos nada com a não efetivação da mudança pretendida em 1648.

Itapecuru Mirim não virou capital do estado do Maranhão e Grão Pará, mas tornou-se um importante polo de desenvolvimento econômico e cultural no século IXX e início do século XX, experimentando um acentuado declínio quando o Rio Itapecuru perdeu sua capacidade de via de transporte e a produção de algodão em suas ribeiras também entrou em colapso.

Atualmente, mesmo com um potencial humano, histórico, cultural e econômico, luta para alcançar uma melhor colocação entre os municípios mais desenvolvidos do estado do Maranhão. É hoje o 60º no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano, com um IDH de 0,599, situado na faixa de municípios com baixo desenvolvimento humano, numa escala que vai de 0,000 a 1,000. Se fosse a capital o município teria o maior IDH do estado, algo em torno de 0,768, como São Luís, mas isso não diz muita coisa não,  pois o IDH ainda não consegue captar com eficiência as reais melhorias nas condições de vida da população.

Mas, como a esperança é a primeira que vive, ainda acreditamos que quando tivermos uma gestão pública que abra canais para que a sociedade civil defina as prioridades municipais e governo e mercado unam forças para cumpri-las, chegaremos rapidamente a ser um dos mais desenvolvidos do Maranhão, com sustentabilidade econômica, social, ambiental, cultural, participativa e tecnológica.

A esperança é a última que morre!

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