Pages

terça-feira, 16 de agosto de 2016

ELEIÇÕES NO MARANHÃO A CACETE



Por Benedito Buzar

Novamente lanço mão do livro do professor Jerônimo de Viveiros – Dois Estudos Históricos, que comenta as eleições realizadas no Maranhão, no período imperial, sob os eflúvios da violência, fraude, corrupção e desmandos.

As ações políticas nada democráticas, praticadas, naquela época, pelos partidos que se alternavam no poder, Moderados ou Cabanos e Exaltados ou Bem-te-vis, não cessaram com o fim da Monarquia. Invadiram os novos tempos da República e se impuseram através das atas falsas, gastanças dos recursos públicos, perseguições, prisões e afrontas à legislação.
Pela leitura do trabalho de Viveiros, conclui-se que tamanhas irregularidades, usadas abusivamente no curso do processo eleitoral, chegaram até os dias recentes, com os mesmos requintes e objetivos, porque facilitavam a tomada do poder e a manutenção do mandonismo e do clientelismo.

No Maranhão, por exemplo, proclamada a República, com relação aos partidos, pouco mudaram, apenas trocaram de nome. Quanto às chefias políticas, migraram das mãos de Gomes de Castro e de Silva Maia para as de Benedito Leite e Urbano Santos, substituídos depois por Magalhães de Almeida e Marcelino Machado, os quais, mutatis mutandis, mantiveram o figurino das eleições do regime monárquico.
Vitorino Freire, que sucedeu àquele elenco de atores políticos, pouco fez para modificar esse quadro. No seu reinando maranhense, continuou aplicando a fórmula dos Moderados e Exaltados, segundo a qual em eleição o feio é perder. Em nome disso, haja fraude, violência e corrupção.

Essa situação só veio a assumir novos contornos, ainda que timidamente, na segunda metade da década de 1960, quando a Justiça Eleitoral realizou uma revisão nos municípios, com vistas a expurgar das folhas de votação os milhares de eleitores fantasmas e ilegais.
Incorre, porém, em clamoroso equívoco quem pensa que depois dessa assepsia eleitoral, as irregularidades embutidas no processo eleitoral, sumiram do nosso cenário político. Continuaram e só diminuíram de intensidade e abrangência com os avanços tecnológicos, que possibilitaram a introdução no país da urna eletrônica, cuja contribuição à pureza do voto, tem sido inegável e impedido que métodos e práticas de um passado histórico, cujas eleições se faziam sob o ritmo dos cacetes.

Não à toa, figuras excelsas da intelectualidade maranhense, como João Lisboa, Sotero dos Reis e Cândido Mendes, através dos jornais do século XIX, mostraram e condenaram as ações dos políticos e dos partidos, que, na ânsia de conquistarem e se manterem no poder, esmeravam-se na arte de adulterar o processo eleitoral.

Vejamos o que escreveu João Lisboa, sobre a compra de voto: “Quanto aos fundos públicos, eram sacrificados, em vésperas de eleições, em compra de casas, em contratos lesivos de todo o gênero, para se acarear o voto deste ou daquele influente no interior, e, não só isso, que no negócio também lucrava certa conhecida influência na Capital, que mediante tais contratos, habilitava os seus devedores para lhes fazerem pagamentos.”  Sotero dos Reis, por sua vez, revelou: “As eleições, eterno pomo de discórdia, já não é possível fazê-las entre nós, de modo que exprimam verdade de qualidade alguma (tanta a corrupção e a imoralidade!), e, portanto, não vale a pena ter combate a todo o transe de uma guerra sem quartel. Aí está esta última miséria, que nos deixa ficar em falta. Quem quiser saber o que é traição, falsidade, má-fé, trapaça, torpezas, asquerosidade, infâmia, mire-se neste espelho e terá o desengano. Em vista desta Babilônia de corrupção e prostituição, onde tudo se acha falseado, mentido, profanado, conspurcado, qual será o homem honesto e cordato, que se exponha a ficar a fogo e sangue com outro por via da eleição?”

Ontem, como hoje, pelos jornais, os partidos lançavam manifestos e proclamações nada construtivos, como este: “De um lado (Moderados) acha-se o nosso grande Partido, rico de ilustrações e possuído de um desejo ardente de promover o bem-estar material e moral desta brilhante estrela da União Brasileira; do outro lado (Exaltados), apenas se distingue, por seus frenéticos excessos, um punhado de homens sedentos de mandos e totalmente privados de fé no presente e de esperanças no futuro”.

De tudo que acontecia naquelas eleições, nada mais repulsivo do que a violência. Nesse particular, afirma Viveiros: “Agremiação partidária que fazia a Mesa Eleitoral e perdia o pleito, apelava para a ata falsa. Para evitar esta espécie de fraude, o adversário só tinha um recurso: o cacete, com o qual obrigava uma apuração verdadeira. Criou-se assim a necessidade de ter cada partido o seu Corpo de Cacetistas, escolhidos cuidadosamente no eleitorado entre os mais musculosos e decididos. O cacetista armava-se na casa do chefe. Era lá que recebia no dia a eleição o seu porrete, que exigia ser grosso e de tatajuba. E porque o corpo de cacetistas representava um elemento de força, ele formava nas reuniões políticas e nas passeatas cívicas, em lugar de destaque, como propaganda do partido a que pertencia”.


Nenhum comentário:

Postar um comentário