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quarta-feira, 8 de julho de 2015

ITAPECURU-MIRIM

        
            Sua trajetória histórica.
                                                  
      SÉRIE CRÔNICAS – ANO II/nº 19/2015

Por: Josemar Lima

A saga de um pedaço do mundo esculpido nas barrancas do Rio Itapecuru e outras histórias...
Neste mês julho celebramos um dos mais importantes fatos históricos no processo de evolução social e administrativa do município de Itapecuru Mirim. No dia 21 de julho de 1870, a Assembleia Legislativa da Província do Maranhão vota e aprova a Lei nº 919, que eleva a Vila de Itapecuru-Mirim, fundada em 27 de novembro de 1817, à categoria de cidade. A Lei foi sancionada pelo vice-presidente da Província, José da Silva Maia.
Na linha de tempo da formação do atual município de Itapecuru Mirim identificam-se, entre outros, dois elementos que estão umbilicalmente associados à formação do seu patrimônio humano, histórico, cultural e ambiental – o Rio Itapecuru e a Estrada de Ferro São Luís Teresina.
Foi às margens do Rio Itapecuru, cujo desenho inicial a natureza começou a esboçar há mais de 300 milhões de anos, que se instalaram os primeiros seres humanos chegados à região e, no nosso caso, os povos posteriormente denominados índios, possivelmente vindos da foz do Rio Amazonas, mas precisamente da região do Arquipélago do Marajó e que aqui foram se organizando em aldeias e ganhando denominações como Guanarés, Tapuias Uritis, Barbados e outros.
Esta fase de ocupação indígena, que remonta há 11 mil anos, ainda existe controvérsias sobre a data exata desse evento, foi uma etapa muito importante na formação de saberes originários da relação direta entre o homem e a natureza. Homem, água, terra e floresta se conhecendo mutuamente e aprendendo, digladiando às vezes e, em muitos outros casos, salvando uns aos outros. As relações com os animais, conhecimentos dos peixes, répteis e mariscos, descobrimentos das plantas medicinais e venenosas e a arte de caminhar seguramente pelas veredas de pedras miúdas.
Depois o grande choque cultural, com a chegada dos homens brancos, inicialmente os jesuítas buscando almas, braços escravos para a agricultura e guerreiros, inicialmente mais braços e guerreiros do que almas, para defesa das causas do colonizador português, formação de patrimônio econômico e suas guerras com franceses e holandeses. Os choques foram inevitáveis entre índios e jesuítas contabilizando-se vários massacres de religiosos aí mesmo nas barracas do rio, mas a morte indiscriminada de índios em batalhas que não eram suas foi desproporcional, levando à extinção várias etnias.
Estavam criadas as condições para o aparecimento das primeiras povoações e elas vieram em decorrência da logística proporcionada pelo Rio Itapecuru. A povoação denominada “Arraial da Feira” foi a primeira delas e tinha seu núcleo ali para as bandas do Cemitério dos Ciganos. Era o lugar preferido para descanso das boiadas e vaqueiros que vinham de outras regiões do estado, do Piauí e até da Bahia, com destino a São Luís. Essa povoação tornou-se importante porque se transformou em um vigoroso entreposto de comercialização de gado bovino e aquisição de víveres e utensílios, uma verdadeira feira que se expandiu rapidamente.
Os naturalistas alemães Johann Baptist Von Spix e Carl Friedr Phil vom Martius que realizaram uma expedição em um Barco a Vapor, tipo  Gaiola, pelo Rio Itapecuru, partindo de Caxias/Ma, em julho de 1819, fazem o seguinte registro ao chegarem a então Vila de Itapecuru-Mirim:
“Este lugar, antigamente denominado “Feira”, deve sua origem ao comércio de gado bovino, pois aqui os sertanejos negociam a venda das boiadas, vindas do Piauí e do interior do Maranhão, em troca de tudo que precisam.”
A povoação cresceu junto com a importância econômica que o Rio Itapecuru, a principal estrada do Maranhão à época, ia ganhando progressivamente e despertando o interesse de empreendedores e aventureiros portugueses interessados no uso das terras para instalação de engenhos e produção de açúcar. Um desses visionários foi Bento Maciel Parente, então Capitão de Estradas, mas que nutria o sonho posteriormente realizado de governar o Maranhão. Ele solicitou ainda em 1630 que a Capitania Geral do Maranhão fosse subdividida em quatro.
Uma delas denominou-se Ribeira do Itapecuru, com o objetivo de fortificar-se contra possíveis invasões estrangeiras na busca das riquezas que começavam a aflorar na região. E ele tinha razão, pois os holandeses tentaram tomar pela força bruta a região, passados alguns anos, inclusive engenhos de alguns de seus parentes.
Começaram, então, as articulações políticas de vários segmentos sociais e propostas individuais junto ao rei de Portugal para fundação da Vila de Itapecuru-Mirim, já a partir de meados do ano de 1751, todas elas não atendidas pela corte portuguesa que optou pela criação da Freguesia de Itapecuru-Mirim, desmembrando-a da Freguesia de Rosário. Nesse período, também, ai por volta de 1755, começaram a chegar à região os primeiros negros africanos escravizados, provenientes da Costa da Mina, atualmente Costa do Marfim, além de Angola e Moçambique, para incrementar a mão de obra indígena já em processo de regressão nas lavouras de cana-de-açúcar e algodão.
Foi nesse cadinho efervescente de culturas, ainda acrescido de irlandeses, açorianos e dos povos do mundo árabe, principalmente sírios e libaneses, que consolidaram identidade e cultura itapecuruenses, consequentemente com mais elementos e riquezas que no resto do estado do Maranhão. E começaram a aparecer, originários das diversas raças e etnias, verdadeiros ícones nas áreas das ciências, letras, artes, política e administração pública.
Provisão Régia de 25 de setembro de 1801 criou a Freguesia de Itapecuru-Mirim, vinculando-a as bênçãos de Nossa Senhora das Dores. Estava também criada a Paróquia que se instalou na Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, como vimos na crônica anterior.
A criação da Vila de Itapecuru-Mirim foi uma verdadeira novela que se estendeu por quase cinquenta anos e merece ser destacada para conhecimento do leitor:
A partir de 1751, com o desenvolvimento vertiginoso da região, começaram as articulações para transformação da Freguesia de Itapecuru-Mirim em uma Vila. O então governador da Província do Maranhão Luís Antônio Viera da Silva enviou uma carta à Corte Portuguesa, endereçada ao rei Dom José, datada de 17 de novembro de 1751, com um abaixo assinado com 1094 assinaturas solicitando a fundação da Vila, alegando que assim o governo poderia melhor atender as reivindicações da comunidade. A solicitação não motivou ações imediatas da Corte Portuguesa. Só em 25 de agosto de 1768, Dom José fez saber ao governador do Maranhão que os moradores da Freguesia da Ribeira do Itapecuru lhe pediram em 12 de setembro de 1765, alvará de confirmação da vila.
O Dicionário Histórico-Geográfico da Província do Maranhão, de autoria de Cesar Marques registra que pela Provisão Régia de 17 de novembro de 1817, Dom João VI fez saber ao ouvidor da comarca do Maranhão que José Gonçalves da Silva, fidalgo da Casa Real, estava autorizado a fundar a Vila de Itapecuru-Mirim, em terras próprias ou doadas pelos moradores da região.
Verifica-se, então, que o conflito de interesses era muito grande obrigando o rei de Portugal a ignorar todas as demandas comunitárias e governamentais a ele endereçadas e conceder autorização a um particular, apenas pelo posto de fidalgo que possuía, para fundação da vila.
Cumpridas as recomendações contidas na Provisão Régia, dando conta da presença de trinta casais brancos e da construção das casas destinadas à câmara, cadeia e oficinas, o Procurador do fidalgo, Antônio Gonçalves Machado, em 20 de outubro de 1818, recebeu ordem para fundação da vila.  
No ano seguinte, afirma Cesar Marques, em 20 de novembro de 1818, quando a povoação já contava com 138 casas e uma população de 767 indivíduos, na Praça da Cruz, com presença de autoridades e do povo local, leu-se em voz alta e inteligível o inteiro teor da Provisão Régia de 27 de novembro de 1817, expedida em consequência do Decreto de 14 de junho do dito ano, e despacho da Mesa de Desembargo do Paço de 17 de julho e 24 de novembro do mesmo ano, determinando a criação da Vila de Itapecuru-Mirim. Um parto que durou quarenta e nove anos povoados por vários fatos históricos importantes para a região e para o estado do Maranhão e no seu período de Vila testemunhou e teve papel relevante nas lutas pela Independência do Brasil e na Guerra da Balaiada.
Como cidade, a partir de 21 de julho de 1870, há exatamente 145 anos, o município de Itapecuru Mirim continuou a sua trajetória, pontuada por conquistas e superações, mas, também, foi marcada por retrocessos históricos nas áreas sociais, cultural, ambiental e político-administrativa, que não são condizentes com toda a potencialidade do patrimônio humano, histórico, cultural e ambiental que herdou e gerou.
Esses apagões, quase todos são originários da incapacidade, miopia histórica, desconhecimento e falta de sensibilidade de grande parte dos gestores públicos em aproveitar toda essa mina de conhecimentos e exemplos dignos deixados por nossos ilustres ancestrais e incorporar ao processo de desenvolvimento do município.
Há, entretanto, interstícios de júbilo e grandeza em todas essas áreas, infelizmente em raros e eventuais momentos, pela força de seu capital humano que, de quando em quando, faz aflorar um tesouro e enche de orgulho e esperança todos nós descendentes dessa saga construída por homens e mulheres com identidade e cultura que os tornam diferentes, fortes para as lutas e dóceis para as artes.
Neste mês de julho celebramos os aniversários de nascimento de dois desses ícones de nossa cultura, ANTÔNIO HENRIQUES LEAL, nascido em Cantanhede, então distrito de Itapecuru Mirim, em 24 de julho de 1828, médico, homem de letras e político. Sua obra mais famosa é o Panteão Maranhense, em quatro volumes. Faleceu no Rio de Janeiro em 29 de setembro de 1885 e RAIMUNDO NONATO COELHO HAHUZ – Zuzu Nahuz, nascido em 23 de julho de 1918, jornalista bastante conceituado, cronista do cotidiano de sua cidade natal. Fez parte das equipes redacionais dos jornais “O Combate” e “A Tarde”, ambos integrantes da AICLA, na condição de Patronos das Cadeiras nºs 27 e 34, ocupadas atualmente pelos acadêmicos Mauro Bastos Pereira Rego e Benedita Silva de Azevedo. 






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