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sábado, 19 de outubro de 2019

ESPERANÇA


    
Mauro Rêgo (*)

            Hoje, às 4 horas da manhã, levantei-me para contemplar o mundo. Do 6º andar da Torre Mare do Condomínio Palazzo de Verona, aqui em São Luís, contemplei a paisagem. Quanta paz naquela hora. As luzes esmaecidas das avenidas pairavam tristemente, mas ainda envolviam a cidade de luz. Um ou outro veículo, de quando em quando, circulava como intruso para perturbar a paz. Ao longe, divisavam-se as luzes dos navios que aguardavam para atracar no Porto do Itaqui e toda a Ilha oferecia um ambiente de beleza e misticismo. 

            É a hora sagrada na qual os espíritos vagam, induzindo as pessoas á reflexão. No campo, é hora de selar o cavalo para viagem sem esquecer o ‘balaio’ nos alforjes. Os pescadores procuram as canoas e saem em busca dos lugares mais apropriados para apanhar os peixes. É também a hora em que os embarcadiços se dirigem ao Troitá ou ao Porto das Gabarras para aguardar a chegada da maré.

            Imaginei quantos jovens drogados voltavam para suas casas ou seus esconderijos. Todos sem esperança, pois os que se viciam é porque a perderam... Fugiram-lhes os sonhos e nenhum ideal crepitava na fogueira de sua juventude. Todos são vítimas das condições sub-humanas a que foram conduzidos pela falta de ideias das autoridades, todos vítimas do tempo que ultrapassava os limites da história.

            Pensei nas palafitas. casebres miseráveis agrupados sobre águas fétidas, por causa dos esgotos sanitários das residências mais nobres e até dos próprios barracos; arremedo de ruas que se equilibram sobre pontes construídas por tábuas apodrecidas suspensas por madeira trazidas de restos de construção.

            Sem emprego e sem trabalho definido, os moradores amargam suas frustrações vendo seus filhos contaminados por doenças provocadas pelas condições insalubres em que vivem. Quase sempre analfabetos, por isso sem esperança, não dispõem de recursos para obter um pouco de café ou biscoitos ou restos de comida para alimentar a família.

            No interior, abandonaram as casas de farinha em torno das quais as comunidades se formavam. Ali estavam a faina e o lazer. Já não se encontravam as rebecas, as sanfonas de poucos baixos ou as gaitas que davam um pouco de alegria aos circundantes. As variações climáticas dizimaram as roças e a doença tirou-lhes o entusiasmo pela vida. Os membros dessas comunidades eram agora a maioria dos moradores dessas palafitas, fugindo das asperezas dos dias, esperando reencontrar suas esperanças na cidade grande.

            Submetendo-me a um tratamento de saúde, lembrei do médico que solicitou que eu ficasse mais um ou dois dias nesta cidade para fazer alguns exames. Logo o pensamento voou para as filas intermináveis de pessoas tentando marcar uma consulta, filas que se formaram também nas portas dos hospitais e outros postos de atendimento público que não estão em condições de atender à demanda. Idosos que se deslocam de enormes distâncias, em transportes precários, para uma sessão de hemodiálise. 

            Voltei ao terraço para olhar o movimento dos veículos que ia aumentando à proporção que o sol banhava a cidade de luz. Também minha esperança de que essa situação se amenizasse foi se esvaindo. A paz de há pouco estava desaparecendo.
   

 



(Mauro Rêgo é escritor, membro da Academia Anajatubense
de Letras, Ciências e Artes (ALCA) e da Academia Itapecuruense
                          de Ciências Letras e Artes (AICLA)

2 comentários:

  1. Parabéns, nobre escritor Mauro Rêgo. Estou realmente sensibilizado com tão lauto comentário. Traz-me à lembrança a época dos grandes mestres de literatura tupiniquim, em que a nossa plaga era ressaltada por seus belos frutos literários e seus representantes áureos desfrutavam de classificação magnífica na escala nacional de escritores. Mas estás de parabéns. E folgo em saber que ainda existem esses faróis de Alexandria, a iluminar a nossa literatura com seus focos maravilhosos, disponibilizando em nossos horizontes, grandiosos feitos como esse vosso artigo, narrando o alvorecer do dia em nossa querida São Luís, Capital do estado do Maranhão que me serviu de berço! Aceitas meu fraterno abraço, escritor ilustre! Continuas nesse caminhada, que o rumo é o certo. Parabéns! Poeta Lázaro - Ma. Membro da ACADEMIA INTERNACIONAL DE LETRA LUSÓFONA.

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  2. Poeta Lázaro - Ma. 98 98861 - 8983.

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