segunda-feira, 17 de agosto de 2020

JARDINEIRO

       *César Borralho

 

 Há um cheiro que ficou no ar

desde que você se foi.

Comprei pá, sacho e um regador

que não pretendo usar. 

 

Pretendo, ao que me permitas,

conduzir tua lavoura no poente

proporcionando ao árido o fértil,

germinando a poesia das sementes

ainda verdes no jardim do teu olhar. 

 

Em tua boca o outono em ventania é o sorriso

que dobra o xaxim à samambaia, ao movê-la,

assim como um pássaro abraça as estrelas

em todo silêncio que é preciso para dobrar

a gaiola em seu voo ou pensamento. 

 

Lembra-te que, por virtude divina ou maldade, 

virá o derradeiro anoitecer (o Jardineiro),

com luvas de primavera e tesoura

que não pretende usar. 

 

Com terra ancestral – negra borracha,

irá desmanchar a mão que escreve,

como o lápis de sol desenha,

com técnica de bonsai, água na neve.

 

  

 

 

*César Borralho, natural de Codó (MA), 1979,  vive em São Luís do Maranhão desde 1979. É professor, mestre em Cultura e Sociedade, especialista em Filosofia da Arte e graduado em Filosofia. Escrever poesia é dar ritmo às imagens que ele cria na eterna luta para que o papel não fique obscuro e nem tão vazio. Poesia é o vento que leva o barco quando barco não há. Nunca aspirou publicar um livro para me tornar poeta, mas se um dia se tornar um poeta, publicará um livro.

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