Por: Jucey Santana
Na
minha infância os benzedores “afamados”
diagnosticavam e tratavam quase todas as doenças tais como: soluço, engasgo com
espinha de peixe, isípa, (erisipela), puxado, espinhela caída, olho gordo,
cobreiro, defluxo, quebranto, mordida de cobra, vento virado, coíra, vermelha,
inveja, maleita, carne aberta, febre
terçã, mãe do corpo, obradeira, doença
do galo, (convulsão), mau olhado e ainda alguns “encostos” leves.
O
benzedor de posse de um ramo de arruda, pinhão
roxo ou vassourinha ia traçando uma cruz sobre o doente ou a doença ao tempo
que murmurava suas rezas cabalísticas e as vezes ainda receitava algumas
“meizinhas”.
Exemplo
de reza para feridas; depois das preliminares com as invocações de praxe o
benzedor rezava:
Jesus é nascido / Jesus nascido é,
Sarai essa ferida /
Bom Jesus de Nazaré.
Tratamento de carne aberta:
Carne aberta /
Nervo torto,
Osso rendido /
carne machucada.
Eu te costuro / carne esgarçada.
Em suas especialidades os benzedores eram
doutores. A eficácia do tratamento
ficava por conta da fé de cada um.
O
povo guardava sua cultura, suas devoções, seus costumes e crendices. Nos
tratamentos populares, a exemplo dos benzedores, o corpo e o espírito estavam
unidos e a cura era obra de Deus.
As
crendices populares eram respeitadas ao pé da letra e éramos vigiados para não
transgredir as regras.
Os
exemplos mais comuns nas minhas lembranças são os seguintes: Se apontasse com o
dedo as estrelas criava verruga; se brincasse com fogo urinava na cama; quem
mentia criava manchas brancas nas unhas;
se pisasse na sombra do outro era azar certo; se virasse a barra da saia era
surra garantida; se cortasse o cabelo na lua quarto crescente ele crescia
rápido; se pisasse em rabo de gato perdia-se o casamento; para curar gagueira batia-se com a colher de
pau na cabeça do gago; se varresse os pés da moça, esta perdia o casamento;
para curar verruga passava-se sal grosso no local, jogava no fogo e corria; se a visita demorava,
colocava-se a vassoura atrás da porta que a ela ia embora; se a criança
custasse a falar tomava água de chocalho ou colocava-se o bico do pinto na boca
da criança que a língua soltava; se vestisse roupa do avesso era chamar a
morte; calçado emborcado era morte certa da mãe; comer cabelouro, (parte fibrosa da carne), detrás da porta chamando o
nome de uma pessoa bonita ficava igual (essa eu fiz chamando minha madrinha
Sinhá Mendes); se comesse carne de porco e
pegasse vento morria na hora; se
a criança nascia com as pernas tortas colocava-se todo dia no pilão; se
passasse embaixo de limoeiro menstruada subia a menstruação para cabeça e outras simpatias, heranças dos ancestrais escravos. Tínhamos
respeito pela sabedoria popular e ensinamentos dos mais velhos, eram
considerados “lei”.
Nos
livros de orações e cantos de Mariana Luz, encontramos vários pedidos para
alcançar saúde e graças diversas, dirigidos aos santos, próprio da
religiosidade popular. A cultura é vida e patrimônio da população de cada região.
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