segunda-feira, 20 de novembro de 2017

ITAPECURU, TERRA DE MILAGRE

                    

Carla  Alencar
                
Há pouco mais de uma década ocorreu nosso primeiro encontro. Mudanças na vida pessoal promoveram um recomeço profissional necessário e assim, em 2014, voltei a Itapecuru Mirim, onde havia trabalhado logo no início da carreira de Promotora de Justiça, quando era titular de Anajatuba.

Estar em Itapecuru Mirim significou uma volta ao começo que trouxe novos desafios, após uma passagem de mais de quatro anos por Caxias. Essa é a nossa vida, uma constante mudança e readaptação.

No ano de 2016, mais um desafio estava programado: atuar na função eleitoral, fiscalizando as eleições municipais em Cantanhede, Itapecuru Mirim e Miranda do Norte.

Os atos preparatórios para as eleições municipais consumiram boa parte da jornada diária de trabalho nos meses de agosto e setembro. Mas, nem imaginava que não iria estar acompanhando a festa da democracia. Muitas estratégias e ações foram idealizadas para colocar em prática no final de semana da eleição, com o apoio incansável de todos que fazem a Justiça Eleitoral e a força policial em Itapecuru, mas não pude delas participar, pois a chegada à cidade não terminou da forma programada.

No dia 1.º de outubro de 2016, não como de costume, chegava à cidade de Itapecuru com três guardiões, anjos postos por Deus no meu caminho. Decidimos, por obra do destino, fazer essa viagem juntos. Era por volta das 14h30min, quando a chegada a Itapecuru foi interrompida de forma inesperada.

No caminho, cruzou uma criança em uma bicicleta e, para não atingi-la, perdi o controle do carro em que viajava sozinha, capotando por diversas vezes na BR 222, sendo o carro arremessado em sequência para um barranco na lateral da pista.

Como é Deus quem escreve a nossa história, aquele não seria meu dia de partir, sendo Itapecuru palco de um verdadeiro milagre, eis que, desde o acidente, tudo foi arquitetado por Deus para que nada de pior comigo acontecesse.

Confesso que nada me recordo daquelas horas seguintes de aflição, até isso foi providenciado para que o sofrimento e a angústia fossem apagados da memória.
Tão logo meu carro parou, presa pelo cinto de segurança, fui alcançada pelos anjos que Deus tinha se encarregado de estar comigo  naquele trajeto: Albert, Samuel e Mirella. A força física foi necessária e contei com o socorro dos dois primeiros, que venceram as dificuldades de encontrar meu carro virado em um barranco para me tirarem de seu interior, além de providenciarem o meu transporte até as margens da rodovia. A terceira não me abandonou um minuto e  esteve no trajeto para o Hospital Regional Adélia Matos Fonseca e depois, durante todo o restante do dia.

Após a retirada do veículo, fui colocada em uma ambulância que providencialmente passava  pelo local,  enviada por Deus para auxiliar no  momento.
Os momentos seguintes não foram fáceis para os que comigo estiveram naquela batalha, eis que as notícias eram desanimadoras. 

A gravidade do acidente a todos assustou e não foi à toa. Foram muitas as fraturas e o pronto atendimento médico era primordial naquele momento. Uma corrente de forças e orações uniu amigos do Ministério Público, do Judiciário, das Polícias Civil e Militar, Corpo de Bombeiros Militar, APAC, Igrejas e muitos que não me conheciam, mas que queriam ajudar naquele momento. 

A transferência não tardou e, em um helicóptero do Comando Tático Aéreo, fui trazida para São Luís, onde receberia a continuação do meu atendimento médico e reencontraria minha família.

Somente após horas de cirurgia e dias de aflição, consegui recobrar a consciência e tomar conhecimento de tudo que envolveu meu acidente: mobilização na minha Itapera e em São Luís, cuidados com minha pequena, transferência de helicóptero, correntes de oração, doação de sangue. Tudo era confuso. Inicialmente, só me vinha à cabeça como tinha sido a eleição, a fiscalização com a polícia e o risco de ter machucado alguém. Com o tempo passando, a ficha foi caindo.

As semanas seguintes foram para estabilização e novas cirurgias já que várias foram as fraturas, mas foram bem menos difíceis do que imaginei quando tive a notícia do acidente e me vi imobilizada em um leito de UTI. Como seria parar a correria em que vivia? Mas, sobrevivi.

Por algum motivo aquele acidente deveria ter acontecido e acreditei desde o início que Deus tinha um propósito em ter me dado livramento naquele dia e nunca me revoltei com o ocorrido, apesar de não entender ainda o porquê. 

Fui escolhida para receber de Deus uma nova oportunidade de viver, tendo sido montado um verdadeiro quebra-cabeça para que tudo desse certo de acordo com Sua vontade: viagem em comboio, resgate quase instantâneo, ambulância passando pelo local vazia, mobilização de amigos, médicos e enfermeiros aptos a prestarem os primeiros socorros tão necessários em Itapecuru, disponibilidade de helicóptero e de equipe de paramédicos, além de muita fé.
Nesse contexto, as orações estiveram sempre presentes, independente de religião, desde o momento do acidente e, posteriormente, nos cultos e na missa em Itapecuru pelo meu restabelecimento, sendo criada ainda a corrente#somostodosCarla, que logo se propagou de forma carinhosa nas redes sociais.

A fé, de fato, é uma força propulsora da saúde e o que comigo ocorreu atingiu meu plano físico, mas nunca atingiu meu plano espiritual. Muito pelo contrário, com o ocorrido, tive a oportunidade de me aproximar ainda mais de Deus e, apesar de alguns momentos de desânimo, pude encarar a nova realidade com otimismo.

Como não agradecer pelo milagre que me foi concedido naquele dia? Qualquer variável diferente do que ocorreu poderia ter levado à minha morte. Como explicar que meu carro, apesar de diversas capotagens, não colidiu com nenhum outro veículo passando pelo local? Como explicar que sai sem sequelas neurológicas de um acidente tão grave?  Como explicar a ambulância passando pelo local tão logo ocorreu o acidente? Só com a intercessão divina para que tudo desse certo e deu. Posso dizer que sou fruto de um verdadeiro milagre de Deus.

Assim como fui protegida no momento do acidente, tendo minha vida preservada por obra de Deus, a fé na recuperação e as infindáveis orações propiciaram uma recuperação que surpreendeu a todos, inclusive aos médicos, sem qualquer sequela neurológica ou em órgãos vitais, e, em pouco menos de um mês do meu renascimento, recebi alta hospitalar, demonstrando a veracidade de algo que ouvi de muitos “Deus não deixa sua obra pela metade”. 
Iniciava-se a parte mais demorada da recuperação, a reabilitação dos membros atingidos no acidente com intensas sessões de fisioterapia, cuja monotonia igualmente foi amenizada com a presença constante da família e de amigos fiéis, ainda que virtualmente, até porque amigo não é estar, é ser. 

Pouco a pouco, com os relatos que me eram feitos, tentei tomar conhecimento do que foi aquele primeiro de outubro e da mobilização gerada pelo acidente, do empenho de muitos que foram utilizados como instrumentos para que tudo desse certo em minha vida. Mas, sei que nunca terei real noção do carinho e da rede de proteção que me cercou.

O retorno à minha Itapecuru foi muito aguardado para tentar agradecer àqueles que tanto me ajudaram e ocorreu  quatro meses após o acidente, em 07 de fevereiro de 2017. Revi muitos amigos queridos e pessoas anônimas que oraram pela minha recuperação, além de ter ido à unidade de saúde em que tive meu primeiro atendimento e onde muitos foram utilizados por Deus para permitir que o Milagre do meu renascimento se efetivasse. Foi um reencontro repleto de emoções e com uma energia indescritível, pois foi em Itapera que me foi dada uma nova chance de viver e essa nova chance não será desperdiçada. Há muito a viver e um novo começo a fazer, com Deus à frente de tudo, pois não há portas que se fechem diante da Sua vontade.


Do livro  Púcaro Literário I ( 2017) pag. 62

Carla Mendes Pereira Alencar Promotora Pública desde 2001, Em janeiro de 2003 foi titularizada em Anajatuba onde permaneceu até 2007, quando foi transferida para o município de Grajaú. Em 2009 foi encaminhada à Caxias ficando até maio de 2014 quando assumiu como titular a 3ª Promotoria de Justiça na Comarca de Itapecuru Mirim.  Já respondeu também pelas comarcas de Cantanhede, Humberto de Campos e em Itapecuru Mirim pela 2ª e 3ª Promotoria em 2003. Foi uma das fundadoras juntamente com a juíza Mirella Cézar da unidade da APAC do município, em 2015.

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