Benedito Buzar
Em meados de 1949, um súbito acontecimento ocorreu
em Itapecuru-Mirim, deixando a sua população em suspense.
Naquela época, a minha cidade contava com limitada
população, reduzido espaço físico e desprovida das modernidades tecnológicas,
mas não deixava de ser aconchegante, sedutora, abençoada por Deus e bonita por
natureza.
Em plena inquietação de meus onze anos, usando
ainda calça curta e cursando o primário no Grupo Escolar Gomes de Sousa,
lembro-me, a despeito das dezenas de anos passados, do fato gerador daquela
repentina e anormal celeuma, que levou a terra de Gomes de Sousa a quebrar a
sua rotina diária de vida, fazendo os seus habitantes viverem momentos de
incomum expectativa e de inusitada comoção.
Mesmo com o tempo a me consumir, minha memória
permanece preservada e permite-me dizer que toda aquela intensa movimentação
humana, tinha por alvo e foco uma casa residencial, localizada na Rua da
Boiada, hoje, senador Benedito Leite, onde morava o casal Maria de Lourdes e
Felício Cassas, de cuja união nasceu os filhos Ivete, Graciete, Myriam,
Marília, Nonato e Elias.
Era naquela casa que aconteciam atos e fatos que,
pelo seu ineditismo e singularidade, abalavam profundamente o sentimento
religioso de uma pacata gente, constituída, em sua grande totalidade, de
católicos, apostólicos, romanos.
Mas quem polarizava as atenções do que ali ocorria,
era uma figura jovem e feminina, que, involuntariamente, transformava a cidade
de Itapecuru num polo de atração religiosa, onde romeiros, crentes e não
crentes em Deus, se aglomeravam para vê-la.
Chamava-se Graciete de Jesus, também,
conhecida por Didica, a terceira filha da prole dos Coelho Cassas, que, desde
criança, mostrava o seu lado de mulher caridosa, literalmente dedicada à
religião católica.
Durante anos, gerações e gerações de itapecuruenses
vieram ao mundo por meio de suas delicadas mãos de parteira habilidosa e a
maneira como se doava ao povo mais necessitado, virtudes que lhe valeram
conquistar inexcedível popularidade, a ponto de transformá-la em líder
política.
Mas o que Graciete fazia para ser alvo de
tanta curiosidade popular? Guardava carinhosamente no seu quarto de dormir, um
quadro de médio porte, com moldura de vidro, onde figurava a estampa de Nossa
Senhora Aparecida, santa que, dia e noite, homenageava e venerava com
flores, velas, orações, preces, promessas e pedidos para cuidar da saúde dela,
da família e dos amigos que a cercavam.
Numa dessas venerações, ela observou algo estranho
na estampa da santa, pois corria incessantemente de seus olhos um tênue fio de
água, como se fosse uma lágrima. Espantou-se com a cena, mas manteve-se em
silêncio e deixou que os dias corressem para só anunciá-lo dias depois quando o
fenômeno continuava e não deixava dúvidas de que a santa chorava para lhe
transmitir alguma mensagem.
Como a santa não parava de chorar, a notícia ganhou
as ruas e a casa dos Coelho Cassas virou um templo sagrado, para aonde acorriam
católicos ou não, de Itapecuru e de outras cidades, para verem de perto e ao
vivo, um ato de fé e de religiosidade.
Não lembro o tempo que durou aquela romaria à casa
de Graciete e até quando as lágrimas de Nossa Senhora Aparecida continuaram a
escorrer pelo seu rosto. Mas sei que o choro da santa, objeto de tanta
curiosidade e especulação, levou o “O Trabalhista”, editado em Itapecuru,
edição de 9 de julho de 1949, a reportar-se ao caso com um texto da lavra do
jornalista João Rodrigues, dono do jornal, que, em certo trecho da matéria,
afirmou categoricamente: “Com o Juiz de Direito, Dr. Caetano Jorge, fomos
ver aquele mistério que confunde a gente, mas que são realmente lágrimas, desde
que não se pode admitir seja o resultado de efeitos físicos, mas gotas
cristalinas que desciam do rosto da Virgem Aparecida”
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