Eliana
Lima Mendes
Ninguém
fica na bonança por muito tempo, assim como ninguém fica na tempestade o tempo
todo. A vida é cheia de altos e baixos e, às vezes, você passa por situações em
que depois fica se perguntando como foi que sobrevivi? Como não morri afogada?
Mas é como dizem por aí “O que não te derruba te deixa mais forte!”.
Me
chamo Cristal, tenho 18 anos e sou uma garota séria, meiga, tímida, perfeita.
Pi! Pi! Pi! Opa, tem alguma coisa apitando! Ah, é o sensor de mentiras pra te
avisar que estou mentindo! Na verdade, sou o contrário do que disse, mas o nome
e a idade são esses mesmos, tá ok? O que mais posso falar sobre mim... Fica por
sua conta descobrir mais, pois o que quero mesmo é contar o episódio marcante
que aconteceu na minha vida.
Na
manhã de 22 de março, estava na biblioteca da escola folheando um livro até
encontrar a imagem de uma pintura que me chamou muita atenção. Ela foi pintada
por Gustave Doré e se chama Andrômeda e minha nossa! Ao ver aquela mulher nua e
acorrentada tentando se afastar de um monstro marinho estranho, senti ser
invadida por um turbilhão de emoções. Podia ver o perigo, o medo e o desespero
se unirem para formarem essa cena forte, bela, sedutora, sombria e fantástica.
No entanto, ela despertava algo mais, um sentimento que eu não sabia dizer qual
era.
Fiquei
admirando a cena por uns bons minutos até ser interrompida pela chegada das
minhas amigas. Estavam ansiosas por novidades, ou melhor, as minhas novidades.
Contei que tinha sido pedida em namoro por Daniel e que tinha aceitado, as duas
ficaram contentes, principalmente a Alice que já tinha me dito que ele valia à
pena, e nisso eu concordo. Elas exigiram mais detalhes do pedido e eu contei tudo
com muito prazer. Às vezes, me sentia meio boba por estar apaixonada. Você já
se sentiu assim? No auge da conversa, Helena apareceu para nos avisar que a
professora já estava na sala fazendo a chamada. Em meio à pressa, Mayla esbarrou
na cadeira e sua bolsa foi de encontro ao chão expulsando de si uma parte do
caderno, um batom e uma cartela de comprimidos que sempre levava consigo aonde
quer que fosse. Fiquei curiosa quanto à finalidade deles, mas acabei esquecendo
de perguntar.
Sexta-feira,
25 de março. Qual notícia eu recebo? “Cristal, Daniel foi encontrado morto.” É
brincadeira! Como assim? O Daniel, morto?! Quase que não acreditei, mas era
essa a triste verdade. Fui ao velório e no enterro e confesso que sentia mais
raiva do que tristeza, ele não merecia esse fim. Não demorou muito para o caso
ser veiculado nos jornais e qualquer um que chegasse em minhas mãos eu já
estava lendo. Na primeira página de um deles estava escrito: “Jovem de 19 anos
foi encontrado morto com um tiro no peito e sem os seus pertences”, este último
fato levava a crê que ele tinha sido vítima de assalto, mas isso ainda não fora
confirmado.
Passaram-se
quatro semanas e eu precisava me distraí um pouco, por isso decidi ficar com
Filipe que já me queria faz tempo. Um dia depois fiquei com André. Depois desse
dia, veja só, Filipe foi encontrado morto no rio por pescadores e passando um
dia, no outro foi a vez do André que sofreu um acidente de moto e não resistiu.
Inacreditável! É realmente inacreditável! Seria eu a causadora dessas mortes?
Fiquei
com esse pensamento por um bom tempo, pois é muita coincidência que os três
garotos sejam mortos depois de terem ficado comigo. Será que fui amaldiçoada e
agora todo garoto que eu namorar será morto? Desse jeito me chamarão de viúva
negra, ou será que tenho um admirador secreto psicopata que não quer que eu
fique com outro cara que não seja ele? Seria simplesmente azar? Era perturbador
não saber as respostas e várias vezes perguntei a Deus o porquê disso está
acontecendo comigo.
Comecei
a ter vários sonhos e pesadelos que se repetiam. Em um deles, eu estava em pé
num quarto meio escuro e olhava para a porta aberta, tentava de todas as
maneiras sair desse quarto, porém não conseguia me mexer, o desespero aumentava
quando percebia que tinha alguém querendo me matar, mas assim que entravam três
homens pela porta, eu acordava ofegante.
Entre
sonhos, pesadelos e inquietações, fui ficando desanimada. Não tinha mais
inspiração para pintar e passava horas e horas trancada no quarto. Entretanto,
não podia continuar assim, precisava fazer alguma coisa, encontrar respostas,
as explicações dadas para essas mortes não eram suficientes, afinal, não tinham
encontrado os culpados, o que já era estranho, nem mesmo as testemunhas do
acidente de André conseguiram dá a descrição da outra pessoa envolvida, o que
disseram foi que ela saiu sem prestar socorro.
Sábado,
sete de maio. Estava na sorveteria, por volta das 17 horas, com minhas amigas e
depois que foram embora, um cara veio puxar papo comigo. Carlos era mais velho
que eu, tinha um olhar que já denunciava suas intenções e com certeza se
tratava do tipo que eu dispensaria logo, mas a minha curiosidade foi maior,
queria saber se ele seria a quarta vítima, por isso aceitei o seu convite de me
levar para um hotel. É claro que não iria pra cama com um cara que mal conhecia,
então comecei a pensar numa maneira de sair dessa situação.
O
hotel era bem simples e muito feio, provavelmente o mais barato. Isso me
ofendeu, ele nem sequer se deu ao trabalho de procurar um com melhores
condições. No quarto, ele foi logo abrindo uma garrafa de vinho que estava numa
mesinha, perto da cama. Preferi não beber, pois aquele vinho parecia ser muito
caro, o que não combinava com a pobreza do lugar e depois, era estranho a
garrafa já está ali sem termos pedido. Eu tinha decidido que fingiria passar
mal e torcer para que desse tudo certo. Não foi preciso. Enquanto estávamos nos
beijando ele pareceu desmaiar, continuava com os olhos abertos, porém senti que
não demoraria em fechá-los, era só uma questão de tempo. Liguei para a
emergência, contei a situação e dei o endereço do hotel e o número do quarto,
já estava prestes a sair para pedir ajuda quando alguém abriu a porta.
Era
a Mayla, parecia uma dominadora assassina com aquela roupa de couro e faca na
mão. Confusa, perguntei o que fazia ali, ela disse: “Vim finalizar minha
vingança, você matou o meu homem, eu matei os seus e agora falta você”. Nunca
imaginaria que era ela a responsável pelas mortes dos meninos e como assim
matei o homem dela? Contestei essa afirmação e ela começou a andar na minha
frente de um lado para o outro com um olhar frio e maléfico. Minha tensão e
nervosismo aumentaram e quando ela citou o nome Henrique Frazão, algumas coisas
começaram a se encaixar.
Henrique
e eu fomos melhores amigos e pelo jeito, Mayla era a namorada que ele falava em
me apresentar. Lamentavelmente, há três anos, sofremos um grave acidente de
moto, ele morreu na hora com traumatismo craniano e eu tive algumas fraturas no
braço e na perna e foi isso o que falei para ela, que tinha sido um acidente.
Ela logo ficou alterada, inquieta e começou a falar um monte de coisas absurdas.
Segundo ela, eu era uma mal amada que queria o Henrique só pra mim, mas como
ele não me queria, decidi que ninguém mais o poderia ter e por isso o matei
fazendo parecer ser um acidente.
Ela
estava louca, claramente fora de si. Teve testemunhas do acidente e ela sabia
disso. Meu Deus! E pensar que todo esse tempo ela só estava fingindo ser minha
amiga? Uma amiga assassina! Mesmo assim, ainda não fazia sentido, tinha que ter
uma explicação lógica para tudo isso, essa, definitivamente, não era a Mayla
que eu conhecia. Aí me lembrei dos comprimidos... Tentei acalmá-la e
infelizmente, a situação piorou.
Preciso
de uma pausa (suspiro). Me desculpe, é que parece que tudo está acontecendo
agora, bem diante dos meus olhos, como num filme. O cenário sombrio. Um homem
morto na cama. Uma garota aparentemente com problemas mentais segurando uma
faca no meu pescoço. O olhar obscuro. Promessa de morte lenta e dolorosa. Quero
fugir do monstro, mas estou acorrentada ao medo e ao desespero, como a
Andrômeda. Pelo menos, Perseu a salvou. E eu, como fico?
Sou
obrigada a beber o vinho. Hesito, porque sei que está envenenado. Recebo
ameaças. Vejo minhas mãos sendo amarradas. Com o rosto contra a parede, sinto a
lâmina marcar minhas costas uma, duas, três vezes. Me esforço para não gritar.
Agora, frente a frente, ela aperta meu pescoço e mira meu rosto. Minhas pernas
começam a ficar dormentes e o estômago, revolto. Olho a porta aberta e ela
começa a ficar embaçada. Lembro do sonho.
Sim!
Sim! Os três homens aparecem. A esperança renasce. Aproveito o momento de distração
para, num último esforço, bater na mão direita e tentar derrubar a faca. Ela
cai perto da cama. Mayla vai pegá-la e eu vou de encontro ao chão com as
pálpebras já pesadas. A última cena que vejo é dos dois homens segurando a
assassina que resiste e o terceiro preparando uma seringa, em seguida, meus
olhos vão se fechando lentamente.
Eliana Lima Mendes
(Estudante do Curso
de Letras pela UEMA, Campus de Itapecuru Mirim – CESITA).
Você é bastante talentosa minha amiga, parabéns!
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