O eco da palavra lírica e os
embates femininos indispensáveis à vida no mundo humano
*Dilercy Adler
MULHERES
NA LITERATURA MARANHENSE é o tema maior da
minha fala adotando, assim, o da própria Mesa. O eco da palavra lírica e os embates femininos indispensáveis à vida no
mundo humano, elegi como um subtema que se firma como um esclarecimento a
mais acerca da linha argumentativa que defini para esta manhã, neste belíssimo
e marcante evento, nesta bela aniversariante cidade de Itapecuru-Mirim, na sua
Primeira Feira de Livros, por isso um grande marco na história da cidade: a I
FLIM!!! Além dos meus Parabéns a esta cidade, quero expressar o meu desejo de
que a esta I FLIM, se sucedam infinitas feiras de livros nesta pródiga cidade.
Quero
iniciar esta minha breve análise com palavras positivas e verdadeiras ,para dar
alento ao coração das mulheres e aos homens
de boa vontade, as quais se referem à quebra de paradigmas relativa a essa
temática, afirmando que essa quebra está sendo feita há algum tempo,
lentamente, mas quebrando sempre... numa
viagem sem volta, e observa-se também uma quebra mais lenta inicialmente,
mas com visíveis avanços que se fortalecem a cada dia.
Também
com palavras de agradecimento a todas as mulheres,
[...]
deusas e humanas que ousaram quebrar os paradigmas opressores do seu tempo e,
destemidamente, fizeram da fragilidade feminina a sua força, o seu escudo, a
sua lança nos embates indispensáveis da vida, sem esquecer o amor e o erotismo,
forças geratrizes de vida e criação (ADLER, 2001, p. 02).
Nesse sentido, temos
coletado em diversas fontes que, historicamente, com raríssimas exceções, o
homem tem marcado a sua existência por meio da sua supremacia sobre a mulher,
em decorrência de que
O universo masculino é caracterizado por mais
plasticidade e acesso a um quantitativo e maior intensidade de estímulos para o
desenvolvimento das suas potencialidades do que o feminino.
Assim é que, também a arte, a exemplo da
ciência, tem demonstrado um quantitativo maior de expressões, de obras
masculinas do que de femininas. Ou seja, em todas as áreas do conhecimento, o
pensamento adotado e divulgado
socialmente é aquele que tem na sua base o modelo eurocêntrico, masculino,
caucasiano e aristocrático (ADLER, 2016, p.230).
Ao se ter acesso a qualquer manual de História
da Literatura, nota-se a débil presença ou completa ausência de mulheres
escritoras.
A lacuna no que diz respeito às mulheres, como
sujeitos na História, é vasta. Nesse contexto, cabe à crítica literária
feminina pesquisas e estudos, darem visibilidade às mulheres, tornando também
audíveis suas vozes e discutindo o real lugar da autoria feminina no cânone
literário, desconstruindo a visão predominante eurocêntrica, masculina,
caucasiana e aristocrática, referida anteriormente. E esta mesa traduz e
concretiza essa preocupação.
De forma prática traremos alguns nomes e
situações de mulheres na literatura maranhense, tomando por fio condutor a
inserção dessas mulheres em três Academias de Letras do Maranhão, mas tomando
por base, inicialmente, a Academia Brasileira de Letras, de modo sucinto.
A Academia Brasileira de Letras-ABL foi fundada
no Estado do Rio de Janeiro, em 20
de julho de 1897, por iniciativa de Machado de Assis, seu primeiro
presidente, com o objetivo de preservar a língua e a literatura nacionais. A sessão inaugural foi
realizada numa sala do Museu Pedagogium, na Rua do Passeio, com a presença de dezesseis
acadêmicos.
Em pé
[da esquerda para a direita]: Rodolfo Amoedo, Artur Azevedo, Inglês
de Sousa, Olavo Bilac, José
Veríssimo, Sousa
Bandeira, Filinto de Almeida, Guimarães
Passos, Valentim
Magalhães, Rodolfo
Bernadelli, Rodrigo Octavio e Heitor
Peixoto. Sentados [também da esquerda para a direita]: João Ribeiro, Machado
de Assis, Lúcio
de Mendonça e Silva Ramos.
Anteriormente,
no dia 28 de janeiro de 1897, fora realizada a sétima e última sessão
preparatória da fundação. Na ocasião foi apresentado o seu Estatuto com as assinaturas de: Machado de
Assis, Presidente; Joaquim Nabuco, Secretário-Geral; Rodrigo Octavio,
Primeiro-Secretário; Silva Ramos, Segundo-Secretário e Inglês de Sousa,
Tesoureiro. E, no seu artigo 2º, preconiza:
Art. 2º - Só podem ser membros efetivos da Academia os brasileiros que tenham, em qualquer dos gêneros de literatura, publicado obras de reconhecido mérito ou, fora desses gêneros, livro de valor literário. As mesmas condições, menos a de nacionalidade, exigem-se para os membros correspondentes.
Ainda no início dos anos 50, o Regimento Interno da
ABL ratifica a impossibilidade de elegibilidade feminina e altera o artigo: os membros efetivos serão eleitos, dentre os
brasileiros, do sexo masculino, deixando mais claro ainda a prerrogativa
excludente do gênero feminino.
A primeira candidatura feminina, Amélia Beviláqua,
em 1930, foi rejeitada, sob a justificativa de que o vocábulo “brasileiros”
restringia suas vagas apenas ao sexo masculino; ficou claro que a Academia
relacionava valor literário a gênero.
A segunda mulher a tentar participar do círculo de
literatos imortais foi Dinah Silveira Queiroz, cuja candidatura também foi
rejeitada. Apenas em 1977 a instituição discutiu novamente a questão da mulher
na Academia, para dar parecer favorável a Rachel de Queiroz (Cadeira 5).
Assim, durante
as primeiras oito décadas de existência da Academia Brasileira de Letras, nenhuma mulher fez parte da instituição (grifo
meu).
Só a
partir dos anos setenta as mulheres ocuparam cadeiras na ABL. Em 1980, foi a
vez de Dinah Silveira de Queiroz (Cadeira 7), que já tinha sido candidata
anteriormente. A terceira mulher a ser membro foi a escritora Lygia Fagundes
Telles, em 1985 (Cadeira 16); em seguida, Nélida Piñon (Cadeira 30), em 1989;
Zélia Gattai, em 2001 (Cadeira 23); Ana Maria Machado (Cadeira 1), em 2003;
Cleonice Berardinelli, em 2009 (Cadeira nº 8); e por fim, Rosiska Darcy (Cadeira 10), em 2013.
Mas outro fato digno de nota é que nenhuma mulher
patroneia nenhuma Cadeira na ABL.
Outro fato digno de nota : A
história da maior ausência dos 121 anos da ABL foi descoberta, por acaso,
durante uma pesquisa em 2005. Júlia Lopes de Almeida (1862-1934), foi o primeiro e mais emblemático vazio
institucional produzido pela barreira de gênero", diz Michele Fanini.
No livro
de Michele Asmar Fanini A (in)visibilidade de um legado
– Seleta de textos dramatúrgicos inéditos de Júlia Lopes de Almeida, lançado
em março de 2017, pela Editora Intermeios e coedição da Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), ela demonstra a importância da
escritora e a redime de uma sociedade machista, cujas barreiras de gênero a
relegaram ao ostracismo institucional.
Júlia era um caso
raro: uma escritora que vivia com o dinheiro da própria escrita. Mãe de
família, casada com o poeta português Filinto de Almeida, foi uma das primeiras
romancistas do Brasil, metade do século 19. No papel de intelectual, que
defendia o abolicionismo, assumia posições feministas e era sucesso de vendas,
ajudou a criar a Academia Brasileira de Letras (ABL). Tudo para ver seu nome
rejeitado a uma Cadeira dentro da instituição por ser mulher.
No Maranhão, vou me reportar à Academia Maranhense
de Letras-AML, à Academia Ludovicense de Letras-ALL e à Academia anfitriã: a
Academia de Ciências, Letras e Artes de Itapecuru Mirim- AICLA.
A Academia Maranhense de Letras, fundada em 10 de agosto
de 1908, por Antônio Lobo, Alfredo de Assis Castro, Astolfo Marques, Barbosa de
Godóis, Corrêa de Araújo, Clodoaldo Freitas, Domingos Barbosa, Fran Paxeco,
Godofredo Viana, I. Xavier de Carvalho, Ribeiro do Amaral e Armando Vieira da
Silva, considerada de utilidade pública pelo Dec. Nº 92, de 19.novembro de
1918, do governador Urbano Santos da Costa Araújo. No seu quadro, 40 cadeiras
patroneadas exclusivamente por intelectuais do sexo masculino. Nela existem
três categorias de membros Fundadores: Fundadores pioneiros, num total de 12;
Fundadores complementares, num total de 08 e Fundadores de Cadeiras, num total
de 20. Nesta terceira categoria encontramos duas mulheres: Laura Rosa (Cadeira. 26) e Mariana Luz (Cadeira. 32). Nos seus quadros de membros, na qualidade de antecessores,
apresenta três nomes femininos: Lucy Teixeira (Cadeira 7); Dagmar Desterro (Cadeira 24) e Conceição Neves Aboud (Cadeira 20), cuja sucessora e ocupante atual é Sônia Almeida. No quadro
atual de ocupantes de cadeiras, existem mais três mulheres, além de Sônia
Almeida: Laura Amélia Damous (Cadeira 6(Cadeira); Ana Luiza Almeida Ferro (Cadeira 12) e Ceres Costa Fernandes (Cadeira 39).
A Academia Ludovicense de Letras-ALL, Casa de Maria Firmina dos
Reis foi fundada em 10 de agosto de 2013.
Sabe-se
que a Academia de Letras de São Luís, apesar de ter sido pensada por muitos
intelectuais da cidade, só se concretizou no bojo de um Projeto proposto pela
ocupante da Cadeira nº 1 do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão-IHGM,
Dilercy Aragão Adler, intitulado “Mil Poemas para Gonçalves Dias. Tendo sido
aprovado o Projeto, a proponente convidou o Confrade Leopoldo Gil Dulcio Vaz,
ocupante da Cadeira nº 40 do IHGM, para assumir conjuntamente a implementação
do referido Projeto. A ideia da elaboração do Projeto veio do Chile, o primeiro
dessa modalidade, “Mil Poemas para Pablo Neruda” que contou com a participação da
poeta Dilercy Adler tanto com poemas como do lançamento no Chile. No projeto local a ideia
proposta foi ampliada, e, além de
poesias, uma segunda Antologia intitulada “ Sobre Gonçalves Dias”, constituída
de artigos e pesquisas sobre a vida de Gonçalves Dias e ainda foram envolvidas três cidades: São Luís,
Caxias (onde Gonçalves Dias nasceu) e
Guimarães (onde faleceu em um naufrágio na Costa dos Atins. Cada cidade tinha a sua
programação e São Luís incluiu nas suas atividades a fundação da Academia de Letras
da cidade: A Academia ludovicense de Letras- ALL.
Vinte e cinco pessoas assinaram o livro ata da
Fundação, juntamente com outras pessoas, como testemunhas, pertencentes a
diversas instituições, nacionais e de outros países, presentes ao ato. Dentre
esse total de assinantes tinha apenas 3 mulheres: Dilercy Aragão Adler, Ana
Luiza Almeida Ferro e Clores Holanda Silva. Depois, o ingresso na Academia
deu-se por indicação de nomes pelos membros fundadores e as demais cadeiras
foram ocupadas por meio de eleições, de modo que as mulheres estão assim
distribuídas dentre as categoria: Membros efetivos fundadores: Dilercy Aragão Adler (Cadeira 8), Clores Holanda
Silva (Cadeira 30) e Ana Luiza Almeida
Ferro (Cadeira 31). Dos Membros efetivos indicados por Membros
Fundadores: Ceres Costa Fernandes (Cadeira 34) e Maria Thereza de Azevedo Neves (Cadeira
13). Membros efetivos eleitos, sendo o 1ª. Ocupante da Cadeira: Miriam Leocádia
Pinheiro Angelim (Cadeira 24) e Jucey Santos de
Santana (Cadeira 35).
Um dado interessante é que das 40
Cadeiras, seis são patroneadas por mulheres, além do que a Patrona da Casa é
uma mulher, negra, filha de uma mulata forra e pai negro. Patronas das
cadeiras: Maria Firmina dos Reis (Cadeira 8),
Laura Rosa (Cadeira
25), Maria de Lourdes Argollo Mello (Dilú Mello - Cadeira
29), Lucy de Jesus Teixeira (Cadeira 34), Maria da Conceição
Neves Aboud, (Cadeira 37) e Dagmar Destêrro e
Silva (Cadeira
38).
A ALL em 3 gestões já teve uma
Presidente do sexo feminino: a Psicóloga, Escritora e Profa. Dra. Dilercy
Aragão Adler (2016-2017.
No livro Maria Firmina dos Reis: uma missão de amor, lançado
em 2017, na página 76, Dilercy Adler expõe a seguinte inquietação:
[...] Embora a ALL tenha sido fundada
401 anos após a fundação da cidade de São Luís, talvez essa demora fosse em
função da espera do tempo/destino do momento
adequado para que Maria Firmina tivesse nela lugar de destaque. Às vezes me
pergunto: Se tivesse sido fundada antes, seria ela a Patrona? Acredito que
dificilmente.
A
Academia Itapecuruense de Ciências, Letras e Artes-AICLA foi fundada em 9 de dezembro de 2011, por
34 Membros Fundadores.
O
seu quadro de Patronas apresenta 5 mulheres: Mariana Luz (Cadeira 1); Maria das Dores Cardoso (Cadeira 7); Graciete de Jesus Cassas e Silva (Cadeira 8); Maria José Lopes Martins (Cadeira 23) e Lili Bandeira (Cadeira 24).
As
ocupantes de cadeiras da AICLA são 5:
Maria da Assenção Lopes Pessoa (Cadeira13),
Jucey Santos de Santana (Cadeira 17), Maria das Mercedes Sampaio de Menezes
(Cadeira 33), Benedita Silva de Azevedo (Cadeira 34) e Terezinha Maria Muniz
Cruz Lopes (Cadeira 36).
Membros Correspondentes.
De um quadro de 24 cadeiras, duas são
patroneadas por mulheres: Blandina
Santos (Cadeira 2), Teresinha Bandeira de Melo (Cadeira 15). Ocupantes Dilercy Aragão
Adler (Cadeira 2), Mirella Cezar Freitas (Cadeira 5), Antonia Silva Mota (Cadeira 7), Maria de Fátima C. Travassos (Cadeira 14) e Maria Cecília Cantanhede Dutra (Cadeira 15).
Dentre
os dois Presidentes na recente história da AICLA, nota-se com satisfação, a
presença de uma mulher: a Escritora Jucey Santos de Santana, atual Presidente.
Uma homenagem especial a uma mulher maranhense que traduz a
palavra nos embates femininos indispensáveis à vida no mundo humano: Através da medicina, Maria Aragão entregou-se às causas
sociais, lutando por uma sociedade justa e igualitária. Foi uma eterna
defensora das bandeiras libertárias e continua a ser referência para a luta
popular do Maranhão. A médica foi também Diretora do Jornal Tribuna do Povo e
lutou contra a ditadura militar.
Os
dados apresentados ratificam as ideias iniciais, tanto de exclusão das mulheres
como da quebra de paradigmas quanto à inserção da palavra feminina no mundo
humano, e já se percebe o eco da palavra lírica e da palavra dos embates
femininos de inserção em todas as áreas de saber, como também nos campos
profissionais.
Assim, nas academias de letras mais novas, já
fundadas neste novo milênio, se observa na amostra pesquisada que, das quatro
academias citadas, as duas centenárias ( ABL, 1897 e a AML, 1908) têm patronos, na sua totalidade, escritores do sexo
masculino, enquanto as duas academias criadas neste novo milênio (ALL, 2013 e a
AICLA, 2011) têm patronas e ocupantes de cadeira do sexo feminino, embora não
seja ainda expressiva essa presença.
Por
isso, reafirmo que essa quebra está sendo feita, lentamente, mas quebrando,
sim, paradigmas, superando exclusão... numa
viagem sem volta. Percebe-se ainda, claramente, um movimento mais lento
inicialmente, mas com visíveis avanços que se fortalecem a cada dia.
Evoé!
Nota:
Do latim evoe : Grito de evocação proferido pelas sacerdotisas que cultuavam
Baco, pelas bacantes.
Por Extensão
Grito de felicidade, de alegria; expressão de entusiasmo e exaltação.
REFERÊNCIAS
ADLER,
Dilercy Aragão. Poesia feminina:
estranha arte de parir palavras. São Luís: Estação Gráfica.2011.
ADLER,
Dilercy Aragão. Maria Firmina dos Reis:
uma missão de amor. São Luís: ALL, 2017.
ADLER,
Dilercy Aragão. Poesia Polarizada a partir do gênero:
Condição real ou engendrada. Associação
de Jornalistas e Escritoras do Brasil-AJEB: Palavras 2016. Porto Alegre:
Evangraf, 2016.
SANTANA,
Jucey Santos de. Mariana Luz: vida e
obra. Itapecuru Mirim: editora, 2014.
*Psicóloga, Doutora em Ciências Pedagógicas, Mestre em Educação, Especializada em Sociologia e em Metodologia da Pesquisas em Psicologia. 12 livros publicados, organizou 12 antologias e integra mais de cem entre nacionais e internacionais. Membro fundador e Presidente da Academia Ludovicense de Letras – ALL (biênio 2016-2017), Membro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, Presidente da Sociedade de Cultura Latina do Brasil, Delegada no Maranhão do Liceo Poético de Benidorm/Espanha, entre outras entidades Lítero- Culturais, e agraciada com várias premiações literárias.
Nenhum comentário:
Postar um comentário