Por: Mauro Rego
Jucey
Santana mais uma vez nos surpreende na sua produção literária. Depois do
sucesso de “Mariana Luz”, ela continua a expressar a sua dedicação à história
de Itapecuru Mirim num trabalho que considero artesanal, em busca do resgate de
nossa cultura através da análise daqueles que foram construindo, às vezes
anonimamente, a nossa identidade de povo.
Silenciosa e dedicada nesse seu
labor, mergulhou em todas as fontes disponíveis, numa pesquisa minuciosa e
responsável, deixando-me atônito diante de suas descobertas, de seus registros,
de sua dedicação.
Ah!, Jucey, como te somos gratos,
pois assumistes um trabalho ao qual nós outros deveríamos ter também nos
dedicado.
Jucey não se limita ao período de
nossa emancipação política, mas foi além do tempo, quando a Ribeira do
Itapecuru ainda vivia nos sonhos de seus primeiros cidadãos. Ela inicia essa
caminhada com a chegada de um dos mais antigos dos nossos empresários, o
irlandês Lourenço Belfort, primeiro comerciante de São Luís que, viajando pelo
Rio Itapecuru, encantou-se com as possibilidades agrícolas da região e
instalou-se com um engenho em Kelru, mutação do nome Kilrue, denominação do
castelo de sua família em Dublin.
Ali ele fez uma experiência
inusitada: a cultura do bicho-da-seda, cuja primeira produção serviu para
confecção de uma roupa para o rei de Portugal.
Kelru, que só anos depois passou a
pertencer a este município, quando seu território foi desmembrado do de
Rosário, foi pioneiro em outros fatos que enobreceram a nossa cultura. Além da
dedicação religiosa a São Patrício, o Saint Patrick irlandês e atravessando o
ciclo da cana-de-açúcar, viveu a primeira experiência da máquina de descaroçar
a amêndoa de babaçu. Embora essa máquina não tenha sido capaz de superar a
quebra manual, foi responsável pela primeira organização do trabalho humilde de
nosso povo, com as quebradeiras de coco hoje valorizadas.
Assim, a biografia de Lourenço
Belfort inicia o desfile de pessoas ilustres que construíram o município do
qual nos orgulhamos. Após essa abertura, o nosso fundador José Gonçalves da
Silva abre os caminhos para a continuação dessa obra rica, não só pelas figuras
evocadas, bem como pela materialidade do trabalho de nossa pesquisadora.
José Gonçalves da Silva, nomeado
Alcaide-Mor pelo Rei de Portugal, mesmo depois que esse título caiu em desuso,
foi designado para fundar a Vila de Itapecuru, a cuja cerimônia compareceu por
seu procurador Antônio Gonçalves Machado. É considerado o fundador de nosso
município.
Jucey segue com a apresentação de
José Félix Pereira de Burgos, o Barão de Itapecuru, aqui nascido no ano de
1780. Militar, ocupou altos cargos na hierarquia do exército brasileiro e foi
um dos que ajudaram a consolidar a Adesão do Maranhão à Independência. Os três
primeiros biografados nos dão a dimensão do trabalho da autora, que contempla
não só os que se destacaram no cultivo das letras, mas, e principalmente, os
empresários, profissionais liberais e educadores de ontem e de hoje, cujo
trabalho foi decisivo na edificação de nossa cidadania.
Surpresas atrás de surpresas, muitos
cidadãos ilustres parecem emergir de contos de fadas, caso de Hastímphilo de
Moura, Blandina Santos e Hermes Rangel, desconhecidos da maioria das pessoas.
Outra personalidade que nos
surpreende é a figura do Prof. Astor Cruz Serra, amigo do Banco do Brasil, o
qual era digno de nossa admiração porque seria o substituto moderno de Gomes de
Sousa, graças ao seu conhecimento de matemática descoberto pelo Prof. Solano
Rodrigues, do Ateneu Teixeira Mendes, que Jucey descobriu brilhando na poesia,
arte que cultivava com maestria, oculto sob o pseudônimo de Astor Raposo, sobrenome de seu pai, Raimundo Elesbão
Raposo.
Só a uma
pesquisadora minuciosa e dedicada, descobrindo jornais antigos, poderia nos
oferecer mais motivos de admiração. Muitas vezes o trabalho de pessoas nascidas
em outras cidades se destaca nesta obra pelo trabalho que aqui desenvolveram.
Cite-se neste caso, a figura do Capelão da FEB, Joaquim Dourado, o J. J.
Dourado, membro da Academia Maranhense de Letras, nascido no Ceará que
desenvolveu o seu trabalho religioso em nossa Paróquia. Engrandecem essa lista
o Prof. Newton Neves, vigário em nossa Paróquia e eminente educador, o Cônego
José Albino Campos, nascido em São Vicente de Férrer, também educador e o
Monsenhor Benedito Pires Chaves que durante quase meio século foi vigário de
Itapecuru Mirim.
Há alguns anos, visitando o amigo
Tufy Aragão, deparei com um cartaz que dizia mais ou menos assim: “Não importa quem você é, não importa de onde
você vem, o que importa é que você faça alguma coisa para melhorar o lugar onde
você está”.
Invocando essas lembranças, recordo
tantos cidadãos ilustres vindos de outras cidades, que se tornaram
itapecuruenses pelo trabalho que aqui desenvolveram. Permito-me citar alguns
biografados, como Orlando Mota (São Luís Gonzaga), Anozilda Fonseca
(Guimarães), Leonel Amorim (Esperantina-PI), Dr. Curtius (Quixadá-CE), Gonçalo
Amador (Presidente Vargas), Alcione Vasconcelos (Mata Roma), Teresinha Cruz
Lopes (Arari), Antônio Lages (Piaui) e outros.
Todos esses se uniram aos
itapecuruenses de nascimento, tornando-nos uma só família, com ideais comuns,
engrandecendo a terra que os acolheu e que tornaram sua, todos merecedores de
serem incluídos entre os 114 biografados. É possível que algumas pessoas
importantes não tenham sido pesquisadas, o que aumenta a responsabilidade de
outros acadêmicos da AICLA buscarem
novos construtores de nossa história.
Entre os biografados, apenas poucos
foram imortalizados com o nome de escolas ou vias públicas. Entre eles, Gomes
de Sousa, Mariana Luz, Juvenal Nascimento, Raimundo Nonato Ferraz, Antônio
Olívio Rodrigues, Leonel Amorim e Benedito Buzar, para citar apenas alguns.
Faço uma menção especial ao Barão de
Santa Rosa, Joaquim Raimundo Nunes Belfort, agraciado com esse título pelo
Imperador D. Pedro II, conforme citação da autora:
(...) Hei de bem fazer-lhe mercê
do título de Barão de Santa Rosa. E quero e mando que o dito tenente coronel
Joaquim Raymundo Nunes Belfort daqui em
diante se chame Barão de Santa Rosa e com o referido título goze de todas as honras, privilégios, isenções,
liberdades e franquias que terão e tem e
de que usam e sempre usaram os barões e que de direito lhes pertencem. E por
firmeza de tudo o que dito é, lhe mandei passar esta carta, por mim assinada a
qual será selada com as Armas Imperiais. Ass. Imperador D. Pedro II, com
guarda.
O Barão de Santa Rosa aos 78 anos de idade e em plena lucidez, em seu
testamento, doou as suas terras, na Fazenda Santa Rosa, neste município, aos
seus ex-escravos, conforme Escritura Pública lavrada pelo Tabelião João
Francisco da Luz, pai de Mariana Luz, em 15.01.1898. Os escravos da Fazenda
Santa Rosa não eram sujeitos a tratamento desumano, pois ali permaneceram depois
da Lei Áurea, onde se sentiam seguros e protegidos. Se fosse o contrário, sim,
teriam fugido, mas para outros lugares onde se formavam os núcleos. Permito-me
citar outro trecho da obra a respeito desse acontecimento:
“Deixo essas
terras para os meus pretos que me serviam como escravos, no meu segundo
estabelecimento de lavoura, para criar filhos, netos e descendentes. Estas terras, não tem quem as compre, nem quem as
venda, nem quem as dê em pagamento (...) podendo roçar nestas mesmas terras,
sem foro algum, todos aqueles que me serviram
como escravos, durante toda sua vida e de seus descendentes, não podendo
em tempo algum serem vendidas, alienadas ou dadas a pagamento as ditas terras
que constituirão um bem perpétuo aos
assim deixados e seus descendentes.
O nosso
Barão, está sendo injustiçado por algumas lideranças, que pretendem transformar
a povoação Santa Rosa, na BR 135, como um ajuntamento de escravos fugidos, ou
Quilombolas, numa verdadeira afronta a fatos de nossa história. Talvez essa atitude
nem beneficiaria tanto a comunidade, que deveria orgulhar-se de suas origens. É
de bom alvitre que a Câmara Municipal reveja o ato que retirou o nome desse
itapecuruense ilustre, da escola de Santa Rosa.
Outro itapecuruense que chamou a
minha atenção foi o professor, político e poeta Raymundo Alexandre Valle de
Carvalho, falecido aos 28 anos de idade.
A capacidade desse conterrâneo fez
com que fosse nomeado Promotor Público e Juiz de Órfãos e Ausentes antes de
completar um ano de formado, o que provocou críticas de setores da oposição na época.
Ele já vinha colecionando outras conquistas: A Inspetoria da Instrução Pública
do Maranhão concedeu-lhe o primeiro lugar ao final de seus estudos de nível
médio e a Congregação da Faculdade de Direito do Recife, por unanimidade, o
premiou como o aluno de melhor aproveitamento acadêmico no terceiro ano do
Curso de Ciências Jurídicas e Sociais. Foi Deputado da Assembleia Provincial
entre 1856 e 1857, tendo atuação brilhante em diversas comissões onde defendeu
projetos de relevantes interesses coletivos. Valle de Carvalho foi um notável
itapecuruense, que não merece ser
esquecido.
Todos os biografados têm méritos
para pertencerem à obra de Jucey, mas ainda peço vênia para relembrar Raimundo
Nogueira da Cruz e Castro, importante político, que conquistou três mandatos de
Deputado Provincial, e Vereador em várias legislaturas, foi o Presidente da
Câmara Municipal de Itapecuru Mirim.
Eleito 3º Vice-Governador do
Maranhão, assumiu a chefia do Executivo Provincial por três períodos e, por
último, retirou-se para sua fazenda Oiteiro, em Itapecuru-Mirim, premido pela
enfermidade que ceifou a sua vida.
O ilustre itapecuruense era padrinho
da poetisa Mariana Luz e bisavô da
escritora Arlete Nogueira da Cruz, viúva do consagrado Nauro Machado.
Meus parabéns a Jucey Santana,
incansável pesquisadora das coisas de Itapecuru, cuja obra atual enriquece
nossa cultura e enobrece a Academia Itapecuruense de Ciências, Artes e Letras
(AICLA).
Que bom saber que em Itapecuru tem pessoas maravilhosas que se preocupam com a cultura local
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