domingo, 11 de setembro de 2016

ITAPECURUENSES NOTÁVEIS



Por: Mauro Rego

            Jucey Santana mais uma vez nos surpreende na sua produção literária. Depois do sucesso de “Mariana Luz”, ela continua a expressar a sua dedicação à história de Itapecuru Mirim num trabalho que considero artesanal, em busca do resgate de nossa cultura através da análise daqueles que foram construindo, às vezes anonimamente, a nossa identidade de povo.

            Silenciosa e dedicada nesse seu labor, mergulhou em todas as fontes disponíveis, numa pesquisa minuciosa e responsável, deixando-me atônito diante de suas descobertas, de seus registros, de sua dedicação.

            Ah!, Jucey, como te somos gratos, pois assumistes um trabalho ao qual nós outros deveríamos ter também nos dedicado.

            Jucey não se limita ao período de nossa emancipação política, mas foi além do tempo, quando a Ribeira do Itapecuru ainda vivia nos sonhos de seus primeiros cidadãos. Ela inicia essa caminhada com a chegada de um dos mais antigos dos nossos empresários, o irlandês Lourenço Belfort, primeiro comerciante de São Luís que, viajando pelo Rio Itapecuru, encantou-se com as possibilidades agrícolas da região e instalou-se com um engenho em Kelru, mutação do nome Kilrue, denominação do castelo de sua família em Dublin.

            Ali ele fez uma experiência inusitada: a cultura do bicho-da-seda, cuja primeira produção serviu para confecção de uma roupa para o rei de Portugal.

            Kelru, que só anos depois passou a pertencer a este município, quando seu território foi desmembrado do de Rosário, foi pioneiro em outros fatos que enobreceram a nossa cultura. Além da dedicação religiosa a São Patrício, o Saint Patrick irlandês e atravessando o ciclo da cana-de-açúcar, viveu a primeira experiência da máquina de descaroçar a amêndoa de babaçu. Embora essa máquina não tenha sido capaz de superar a quebra manual, foi responsável pela primeira organização do trabalho humilde de nosso povo, com as quebradeiras de coco hoje valorizadas.

            Assim, a biografia de Lourenço Belfort inicia o desfile de pessoas ilustres que construíram o município do qual nos orgulhamos. Após essa abertura, o nosso fundador José Gonçalves da Silva abre os caminhos para a continuação dessa obra rica, não só pelas figuras evocadas, bem como pela materialidade do trabalho de nossa pesquisadora.

            José Gonçalves da Silva, nomeado Alcaide-Mor pelo Rei de Portugal, mesmo depois que esse título caiu em desuso, foi designado para fundar a Vila de Itapecuru, a cuja cerimônia compareceu por seu procurador Antônio Gonçalves Machado. É considerado o fundador de nosso município.

            Jucey segue com a apresentação de José Félix Pereira de Burgos, o Barão de Itapecuru, aqui nascido no ano de 1780. Militar, ocupou altos cargos na hierarquia do exército brasileiro e foi um dos que ajudaram a consolidar a Adesão do Maranhão à Independência. Os três primeiros biografados nos dão a dimensão do trabalho da autora, que contempla não só os que se destacaram no cultivo das letras, mas, e principalmente, os empresários, profissionais liberais e educadores de ontem e de hoje, cujo trabalho foi decisivo na edificação de nossa cidadania. 

            Surpresas atrás de surpresas, muitos cidadãos ilustres parecem emergir de contos de fadas, caso de Hastímphilo de Moura, Blandina Santos e Hermes Rangel, desconhecidos da maioria das pessoas.

            Outra personalidade que nos surpreende é a figura do Prof. Astor Cruz Serra, amigo do Banco do Brasil, o qual era digno de nossa admiração porque seria o substituto moderno de Gomes de Sousa, graças ao seu conhecimento de matemática descoberto pelo Prof. Solano Rodrigues, do Ateneu Teixeira Mendes, que Jucey descobriu brilhando na poesia, arte que cultivava com maestria, oculto sob o pseudônimo de Astor Raposo,  sobrenome de seu pai, Raimundo Elesbão Raposo.

Só a uma pesquisadora minuciosa e dedicada, descobrindo jornais antigos, poderia nos oferecer mais motivos de admiração. Muitas vezes o trabalho de pessoas nascidas em outras cidades se destaca nesta obra pelo trabalho que aqui desenvolveram. Cite-se neste caso, a figura do Capelão da FEB, Joaquim Dourado, o J. J. Dourado, membro da Academia Maranhense de Letras, nascido no Ceará que desenvolveu o seu trabalho religioso em nossa Paróquia. Engrandecem essa lista o Prof. Newton Neves, vigário em nossa Paróquia e eminente educador, o Cônego José Albino Campos, nascido em São Vicente de Férrer, também educador e o Monsenhor Benedito Pires Chaves que durante quase meio século foi vigário de Itapecuru Mirim.

            Há alguns anos, visitando o amigo Tufy Aragão, deparei com um cartaz que dizia mais ou menos assim: “Não importa quem você é, não importa de onde você vem, o que importa é que você faça alguma coisa para melhorar o lugar onde você está”.

            Invocando essas lembranças, recordo tantos cidadãos ilustres vindos de outras cidades, que se tornaram itapecuruenses pelo trabalho que aqui desenvolveram. Permito-me citar alguns biografados, como Orlando Mota (São Luís Gonzaga), Anozilda Fonseca (Guimarães), Leonel Amorim (Esperantina-PI), Dr. Curtius (Quixadá-CE), Gonçalo Amador (Presidente Vargas), Alcione Vasconcelos (Mata Roma), Teresinha Cruz Lopes (Arari), Antônio Lages (Piaui) e outros.

            Todos esses se uniram aos itapecuruenses de nascimento, tornando-nos uma só família, com ideais comuns, engrandecendo a terra que os acolheu e que tornaram sua, todos merecedores de serem incluídos entre os 114 biografados. É possível que algumas pessoas importantes não tenham sido pesquisadas, o que aumenta a responsabilidade de outros acadêmicos da AICLA  buscarem novos construtores de nossa história.

            Entre os biografados, apenas poucos foram imortalizados com o nome de escolas ou vias públicas. Entre eles, Gomes de Sousa, Mariana Luz, Juvenal Nascimento, Raimundo Nonato Ferraz, Antônio Olívio Rodrigues, Leonel Amorim e Benedito Buzar, para citar apenas alguns.

            Faço uma menção especial ao Barão de Santa Rosa, Joaquim Raimundo Nunes Belfort, agraciado com esse título pelo Imperador D. Pedro II, conforme citação da autora:
                                   (...) Hei de bem fazer-lhe mercê do título de Barão de Santa Rosa. E quero e mando que o dito tenente coronel Joaquim Raymundo Nunes Belfort  daqui em diante se chame Barão de Santa Rosa e com o referido título goze  de todas as honras, privilégios, isenções, liberdades e franquias que terão e tem  e de que usam e sempre usaram os barões e que de direito lhes pertencem. E por firmeza de tudo o que dito é, lhe mandei passar esta carta, por mim assinada a qual será selada com as Armas Imperiais. Ass. Imperador D. Pedro II, com guarda.

                        O Barão de Santa Rosa aos 78 anos de idade e em plena lucidez, em seu testamento, doou as suas terras, na Fazenda Santa Rosa, neste município, aos seus ex-escravos, conforme Escritura Pública lavrada pelo Tabelião João Francisco da Luz, pai de Mariana Luz, em 15.01.1898. Os escravos da Fazenda Santa Rosa não eram sujeitos a tratamento desumano, pois ali permaneceram depois da Lei Áurea, onde se sentiam seguros e protegidos. Se fosse o contrário, sim, teriam fugido, mas para outros lugares onde se formavam os núcleos. Permito-me citar outro trecho da obra a respeito desse acontecimento:

“Deixo essas terras para os meus pretos que me serviam como escravos, no meu segundo estabelecimento de lavoura, para criar filhos, netos e descendentes. Estas  terras, não tem quem as compre, nem quem as venda, nem quem as dê em pagamento (...) podendo roçar nestas mesmas terras, sem foro algum, todos aqueles que me serviram  como escravos, durante toda sua vida e de seus descendentes, não podendo em tempo algum serem vendidas, alienadas ou dadas a pagamento as ditas terras que constituirão um bem perpétuo  aos assim deixados e seus descendentes. 


            O nosso Barão, está sendo injustiçado por algumas lideranças, que pretendem transformar a povoação Santa Rosa, na BR 135, como um ajuntamento de escravos fugidos, ou Quilombolas, numa verdadeira afronta a fatos de nossa história. Talvez essa atitude nem beneficiaria tanto a comunidade, que deveria orgulhar-se de suas origens. É de bom alvitre que a Câmara Municipal reveja o ato que retirou o nome desse itapecuruense ilustre, da escola de Santa Rosa.

            Outro itapecuruense que chamou a minha atenção foi o professor, político e poeta Raymundo Alexandre Valle de Carvalho, falecido aos 28 anos de idade.

            A capacidade desse conterrâneo fez com que fosse nomeado Promotor Público e Juiz de Órfãos e Ausentes antes de completar um ano de formado, o que provocou críticas de setores da oposição na época. Ele já vinha colecionando outras conquistas: A Inspetoria da Instrução Pública do Maranhão concedeu-lhe o primeiro lugar ao final de seus estudos de nível médio e a Congregação da Faculdade de Direito do Recife, por unanimidade, o premiou como o aluno de melhor aproveitamento acadêmico no terceiro ano do Curso de Ciências Jurídicas e Sociais. Foi Deputado da Assembleia Provincial entre 1856 e 1857, tendo atuação brilhante em diversas comissões onde defendeu projetos de relevantes interesses coletivos. Valle de Carvalho foi um notável itapecuruense,  que não merece ser esquecido.

            Todos os biografados têm méritos para pertencerem à obra de Jucey, mas ainda peço vênia para relembrar Raimundo Nogueira da Cruz e Castro, importante político, que conquistou três mandatos de Deputado Provincial, e Vereador em várias legislaturas, foi o Presidente da Câmara Municipal de Itapecuru Mirim.

            Eleito 3º Vice-Governador do Maranhão, assumiu a chefia do Executivo Provincial por três períodos e, por último, retirou-se para sua fazenda Oiteiro, em Itapecuru-Mirim, premido pela enfermidade que ceifou a sua vida.

            O ilustre itapecuruense era padrinho da poetisa Mariana Luz e bisavô  da escritora Arlete Nogueira da Cruz, viúva do consagrado Nauro Machado.

            Meus parabéns a Jucey Santana, incansável pesquisadora das coisas de Itapecuru, cuja obra atual enriquece nossa cultura e enobrece a Academia Itapecuruense de Ciências, Artes e Letras (AICLA).


Um comentário:

  1. Que bom saber que em Itapecuru tem pessoas maravilhosas que se preocupam com a cultura local

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