Tiago
Oliveira
Quando
faltavam dez luas para o ritual, os Tabajaras escolhiam dentre suas índias
virgens a que fosse a guerreira mais forte, que a partir de então era preparada
com o ensinamento do seu povo, por meio dos ritos de passagem, para só depois
ser entregue a mística cobra. Chegado o dia todos se reuniam as margens do rio
ao amanhecer e lá ficavam invocando o por meio de cânticos, gritos e danças;
até o momento que ele movia o seu corpo na fenda de sua morada, sinalizando que
já era a hora do seu presente começar a ser ornamentado, quando ocorria o
segundo movimento, sempre ao cair da noite era a hora de receber o seu
presente, e assim a virgem era lançada nas águas do rio: sentada numa balsa de
sororoca, com as mãos amarradas para trás, com o corpo coberto de urucum e no
seu colo dois olhos em destaque na cor de rubi, que simbolizava os olhos da
grande cobra, o cabelo jogado para frente do rosto cobrindo assim os olhos.
Para
o costume deste povo, o ritual servia para proteger este povo contra os
invasores, grandes enchentes, mortes por afogamento, além de oferecer fartura
de peixes, caças e frutos. Contundo, as missões volantes dos jesuítas
comandadas por Pedro Parente, que subiam ano a ano os rios maranhenses chegaram
aos mais longes confins do Itapecuru e assim atingem a grande Taba dos
Tabajaras.
Após
algum tempo dos primeiros contatos, os nativos resolvem aceitar a participação
do homem branco nesse ritual, mas com desconfiança, pois, suspeitavam que o
desejo de um desses homens era matar o Deus dos Tabajaras e tirar dos seus
olhos as duas pedras vermelhas que brilhavam.
O maioral já havia comunicado a
todos que: caso algo saísse errado, todos deveriam fugir na direção da aldeia
de paz de Anajatuba, para chegarem até a Ilha dos Caranguejos, onde deveriam
formar a sua nova Taba e que os guerreiros deveriam ficar para proteger os
pajés, durante o ritual, pois eles desejavam
conduzir a sua serpente para junto deles. O maior deles Magé Tabajara prepara uma
flecha contaminada com o veneno de um sapo da região e fica à espreita. Um dos
homens brancos, Rabelo D’eça com o pretexto de também ofertar presentes de seu
povo a Jurupari consegue colocar, seis bias cheias de pólvoras dentro da balsa
das oferendas.
A noite vai turvando, às margens do Itapecuru,
neste momento há o segundo movimento na fenda, é então, a hora da balsa ser
lançada aos poucos, sendo segura por cordas de embiras evitando que a corrente
a leve para baixo e assim fique à espera do ato final.
D’eça à espreita na ribanceira do
rio não percebe que também está sendo espiado por Magé. As águas se agitam e de
um rompante só um imenso ser prolonga seu corpo para fora d’água na direção de
sua oferenda, os missionários inacianos se assustam e se afastam, toda a tribo
se agacha demostrando respeito, neste momento o homem branco tenta acender o
pavio que detonaria a balsa e matando a sua presa, mas é alvejado mortalmente pela
flecha de Magé. Segue um silêncio, até que o ritual seja concluído, quando o
animal volta para sua morada. O maioral, grita em voz alta: matem todos os
brancos! No entanto, é permitido que o líder da missão retorne para avisar aos
demais que não devem mais incomodar os Tabajaras novamente.
Após o ocorrido, seguem-se os
preparativos para a jornada a caminho da nova morada deste povo guerreiro na
encantada Ilha dos Caranguejos. Porém, os colonizadores não desistem e tempos
depois fundam na mesma localidade a Azurita do Itapecuru, que segundo a lenda
ainda sofre com a perda do seu ser protetor, ocorrendo de tempos em tempos, mortes
por afogamentos, grandes enchentes, secas do rio e até abalos de terras
inexplicáveis.
Tiago de Oliveira Ferreira é Graduado em Língua Portuguesa e Literatura (UEMA) e Pós-graduado pelo Instituto Superior Franciscano (IESF). Professor de Santa Rita (MA) e Itapecuru Mirim. Professor Substituto da Universidade Estadual do Maranhão – UEMA, Campus CESITA – Itapecuru Mirim. Livros publicados: Caminhos do Itapecuru uma viagem, pelo Jardim do Maranhão (2016); Areias de Santa Rita (2017). E membro da Academia Itapecuruense de Letras, Ciências e Artes – AICLA.
Obgd
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