sábado, 5 de março de 2016

MARIANA LUZ

Por:  Crysósthomo de Souza (1945)

    Nascida na cidade de Itapecuru-Mirim, a vetusta e gloriosa terra de Gomes de Souza, o seu pai, notário público, mandou-a para São Luís cursar afamado colégio, como interna. Inteligente e aplicada, cedo lhe desabotoaram as faculdades mentais e, menina  moça, no seu sonho de deslumbramento acordara-se-lhe a sensibilidade para o batismo lustral de arte e de beleza perene.
E Mariana Luz surgiu, então, na ribalta da vida, entre trinados e gorjeios, no seu suave encantamento de adolescente, enamorada de Apolo. E afez-se para as campanhas da arte, em torneios memoráveis em que a sua inteligência fagulhava em intensas vibrações.
     Sua vida literária foi sempre das mais fecundas, compreendendo dois períodos: o de sua mocidade em que se lhe esmerou a verve poética e o período de vida trabalhosa, certamente no tempo em que lhe faleceu o pai e a poetisa ficou balda de recursos subsistências.
    Com um raro poder de ação e crendo, principalmente, nas suas forças vitais, deu de arrancada desde cedo, para aparar a todos os golpes que se lhe vibrassem a adversidade da sorte, e, com a fidalguia dos seus mais puros sentimentos, achou de nobre trabalhar para viver e viver para maior esplendor do seu nome. E abriu um colégio, acolhendo, nas salas de sua vasta residência, grande número de crianças de sua terra.
    Poetisa e professora, plasmando espíritos para o futuro da Pátria e cantando, como os pássaros, para encher de glória a sua terra!
E nesse árduo mister, preparou várias gerações de que se têm destacado homens de real mérito na vida pública e intelectual do Maranhão.

    Tem escrito em jornais e revistas, havendo colaborado em poliantéias ao lado de Coelho Neto, Humberto de Campos, Antônio Lobo e outros notáveis escritores brasileiros. Quando Coelho Neto visitou, pela última vez, a sua terra natal, numa campanha política contra os garnachas e politiqueiros que o alijaram da deputação federal, quis rever Mariana, que outrora lhe dedicara uma das suas bem trabalhadas poesias, que mereceu do genial escritor maranhense as mais vivas e envaidecedoras referências.
    Mereceu-as,  a ilustre poetisa itapecuruense, o que é de muito envaidecer, por ter sido julgada por Coelho Neto.
    Mariana Luz é uma poetisa de apreciável estro. Suas produções revestem-se de encantador lirismo, de uma suave musicalidade, em movimentos de cores e de luz. Têm a forma escorreita em altas vibrações cromáticas. Esparsas, como estavam, pouco diriam do seu valor  então,  as reuniu em um livro a que deu o  título  Murmúrios, ainda inédito, esperando algum generoso Mecenas para editá-lo.
Exercitou-se ainda a poetisa no teatro como autora. E de seu repertório sabemos algumas peças de incontestável valor representativo, como Por causa do Ouro, Miss Semana, Eu também sou Eleitora, Casamento na Roça, São José e outras.
    Veio-lhe o declínio em envelhecendo, deixou de ensinar e, triste, quase em extremo abandono, num velho pardieiro, vive “cigarra que o inverno encontrou sem pão!”
    Bem o sentira ela, bem o sentira, sim, quando, na revista do Centro Caixeiral, no seu número de aniversário, em 1906, ainda na juventude, a poetisa publicava os versos sentidamente humanos – O milionário e o poeta:
    E foi assim que a poetisa transpôs a velhice com o coração cheio de amor, amor pela arte, pela beleza eterna, amor pelas crianças que lhe brincavam ao redor, descuidadas e irrequietas, a sugar-lhe o mel delicioso da sua inteligência e do seu saber com que ela as ensinava, plasmando-as para os embates da vida.
    Vendo-a, todavia, nesse doloroso estado de abandono, o vigário de sua freguesia, padre Joaquim Dourado, espírito fulgurante de aedo e de esteta, comoveu-se de vê-la e ouvi-la, como que exilada dentro de sua própria terra e, decidido e impávido, promoveu um movimento em torno da poetisa e, apoiado pela generosidade do seu povo e do prefeito de Itapecuru-Mirim, Bernardo Thiago de Matos, cujo gesto mereceu o beneplácito do interventor Paulo Ramos que, em nome do seu benemérito               Governo, contribuiu com dois mil cruzeiros, construíram-lhe uma confortável morada em que        atualmente repousa na sua gloriosa velhice.
 E enquanto o inverno passa a cigarra canta.
    E assim a poetisa vai consumindo os seus últimos dias, cercada de estima e de admiração de sua gente num doce halo de resplandecente felicidade espiritual.  (Do livro   inédito “Páginas de Saudade”)








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