quarta-feira, 3 de maio de 2017

Pororoca



Clodomira Batalha
Elas estavam sempre lá, com seus bancos e trouxas de roupas a lavar.
De longe dava para acompanhar o compasso das batidas de buraçanga (cacete com que se sova a roupa, na lavagem) ao mesmo tempo em que colocavam as no­tícias em dia.
A molecada entrava no compasso entre saltos e mergulho. De repente o ritmo é acelerado como gritos em forma de ola. Lá vem ela! A mulherada já alertada arrancam seus bancos e roupas e correm assustadas.
La vem a terrível e temida pororoca, já definida pelos Tupis como “estrondosa”. Esse estrondo surge do confronto de águas causando grandes ondas com gran­de velocidade que sai levando e derrubando tudo que encontra pela frente. Ela amedronta, assusta e desafia, fazendo com que todos se afastem e fiquem a observar. A pergunta silenciosa nos olhares é unânime:
Quem se atreve a barrar ou enfrentar esse gigante?
Até que surgem os meninos do rio, pés descalços, sorriso maroto dos surfistas de maré e desafia a temi­da pororoca. Os curiosos se aproximam e a plateia é formada, todos querem assistir o confronto. O duelo começa. Lá vem ela com toda sua fúria, os surfistas de maré pegam suas pranchas e de joelhos partem literal­mente para cima da pororoca e começam a deslizar so­bre suas ondas como que domando a fera e soltam gri­tos de alegria! Eles dançam sobre ela até que sua fúria se desfaz. A plateia vibra ao mesmo tempo em que vão se dispersando e meditando... como enfrentar e ao mesmo tempo desfrutar das “pororocas” que se apresentam em nosso dia a dia? que nos arrastam tirando nosso chão, nossas forças e nos fazem muitas vezes submergir em suas águas turvas? Os surfistas de maré dão uma lição.
Existem situações na vida que são inevitáveis e não há como se colocar de frente, a única solução é partir pra cima, assim como o surfista de maré. É bem verdade que, entre sair de frente e se colocar em cima há um longo caminho, há muitos tombos, se bebe mui­ta água até se obter um equilíbrio e segurança. Quem consegue esse equilíbrio tem uma visão privilegiada, há uma beleza que só desfruta quem rompe e se coloca por cima. Por isso quando as pororocas da vida se apresen­tarem, não vão de frente, não tenha medo e nem pressa para que ela se vá. Desliza, dance, solte seu grito, seja um surfista e tire o que há de melhor das pororocas da vida Pois logo ela passará, mas, a lição ficará. Há! Fique atento, ela sempre volta. 


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