quinta-feira, 25 de maio de 2017

HOJE É DIA DE RUA DA PALMA


João Batalha
















Antigo circuito de diversão e prazer                                             
 

Quando vim a São Luís pela primeira vez, em 1961,  o ponto de chegada foi a Praia Grande, onde adentrei  no universo dos casarões de arquitetura colonial deslumbrante revestidos de azulejos e porcelanas vindos de Portugal.  Minha primeira hospedagem foi na Rua da Palma, artéria pública onde funcionava o maior itinerário de prazer e diversão da capital, desde a 14 de Julho,  até a Jacinto Maia.  Era o polígono da diversão noturna da metrópole maranhense. O reino encantado da boemia de São Luís. A cidade atravessava um período de grande efervescência política e cultural e o destaque da moda feminina era a minissaia, somente na década seguinte surgiu “a queima dos sutiãs”.

            O circuito de diversão e dos prazeres carnais  se concentrava na Zona do Baixo Meretrício, a famosa ZBM, na circunferência das ruas 28 de Julho, Estrela, Saúde, Henriques Leal e Palma. Nesta última ficavam as mais famosas pensões. Atrativas e seletas, com seus casarões seculares e suas casas noturnas pomposas, frequentadas por gente da alta sociedade:  políticos, desembargadores, professores, artistas, poetas, cronistas,  jornalistas, escritores, empresários, oficiais militares,  e outros conhecidos reis da vadiagem.  Era onde se cobrava os cachês mais altos  pelas poucas horas de lazer. Pensões luxuosas e requintadas, iluminadas por  neons e meia-luz, que emprestavam beleza às boates, entre as quais, a Class, Elite, Bela Vista, Novacap, Oásis, City, Bangalô, Cristal e Monte Carlo.
 Esfera repleta de bares e restaurantes. Era na ZBM que os boêmios marcavam seus encontros e aventuras. Incitados por  Whiski   e excitados pelos crepúsculos dos desejos sedutores e de alucinantes e irrefletidas paixões, ao som dos velhos tangos, boleros  e canções românticas de origens brasileira, cubana caribenha e outras variedades hispanoamericanas  que se faziam ouvir através das potentes radiolas, com agulhas de diamante, que deslizavam sobre os discos de vinil (os famosos Long Plays). Prostíbulos, cuja finalidade era aproximar os corpos de sexos opostos em ambiente de músicas, bebidas e nostalgia. Meia-luz não apenas  para dar beleza ao ambiente, mas,  também,  para encobrir a perda da jovialidade de algumas das raparigas, em decorrência dos excessos da vida noturna.    No escuro, ou à penumbra, após ingerir alguns goles de Vermute, todas pareciam bonitas.  Ambiente  vulgar e marginalizado para os estratos conservadores da sociedade, glamour dos liberais onde os boêmio procuravam sensualidade e prazer.  As ZBMs não eram frequentadas somente pelos raparigueiros. Era, também, lugar de diversão para o que a frequentavam somente por distração ou para curtir belas músicas e tomar cervejas, além de servir como espaço de encontro para acertos e negócios, onde corria dinheiro e se discutia as influências sociais e econômicas do Estado e da Capital.  À época, o homossexualismo era repudiado e muito discriminado. Os homossexuais vistos por lá faziam os serviços pesados dos cabarés ou então se especializavam como bons cozinheiros.
            Nas ruas  28 de Julho, Henriques Leal, Saúde e Estrela, em casas coladas umas nas outras, ficavam os cabarés mais modestas e menos  importantes onde se abrigavam  as mulheres que iam perdendo os atrativos do corpo em decorrência da idade. Prostíbulos, com banheiros e sanitários coletivos. Lupanares onde se concentrava a classe  de menor poder aquisitivo: operários, estudantes lisos, comerciários endividados, etc. Nesses locais,  a possibilidade de contrair doenças venéreas era maior.  As pensões Itu, Filial da Maroca e Monte Rei, também pomposas, ficavam na Rua 28 de Julho, onde, também, mulheres bonitas e insinuantes, ociosas, transbordantes de sensualidade, elegância e beleza, vendedoras de prazer desfilavam ante a luz negra dos luxuosos salões.
 


Nesses casarões de dois andares funcionavam as luxuosas  boates  Class e Elite. 


No casarão da direita ficava a boate Bela Vista, uma das mais movimentadas da cidade.


Na  casa de esquina (D) próxima ao então  Quartel Militar (Convento das Mercês) ficava o comércio dos irmãos Bizica e  Bizuca, onde diariamente fazia meu lanche de pão com  refresco de maracujá.  Ao lado (casa de teto mais elevado), ficava a residência do Pe. Arthur Lopes Gonçalves (atual redação do jornal A TARDE).


No aposento da janela à direita, do terceiro andar deste prédio, (pensão da Dona Geralda, de quem fui hóspede pela primeira vez que vim a São Luís),  morei por vários anos na década de 1960.

Localizada em área de tombamento de São Luís a Rua da Palma está decadente e exposta ao abandono. Alguns dos seus casarões que  foram pomposos e importantes no passado estão correndo risco de desabamento e necessitando de urgente recuperação. O Centro Histórico, do qual faz parte da Rua da Palma clama por revitalização.

(*) Fotos de Domínio Público colhidas na Internete, com créditos de Diego Chaves, Fernando Cunha e Fernando Bezerra.



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