Discurso
de posse na Academia Itapecuruense de Ciências, Letras e Artes proferido em
Itapecuru-Mirim em 19/10/2019 pelo acadêmico *Maurel Mamede Selares
Inicialmente, agradeço a Deus
por esta oportunidade e peço a Sua bênção neste instante.
Excelentíssima Senhora
Presidente da Academia Itapecuruense de Ciências, Letras e Artes, Acadêmica Jucey
Santos de Santana, Excelentíssimo Senhor Presidente em Exercício da Academia
Itapecuruense de Ciências, Letras e Artes, Acadêmico Inaldo Lisboa, Excelentíssimo
Senhor Presidente da Academia Maranhense de Letras, Acadêmico Benedito Buzar,
Ilustríssimo Senhor Acadêmico da Academia Caxiense de Letras, Senhor Wibson
Carvalho, Ilustríssimo Senhor Acadêmico da Academia Caxiense de Letras, Senhor
Ezíquio Barros Neto, nas pessoas de quem saúdo todos os demais membros da AICLA.
Autoridades que aqui se encontram.
Meus pais, esposa, filhos, meus
familiares e amigos, senhoras e senhores aqui presentes, muito boa noite!
Ao
preparar o meu discurso de posse nesta ilustre academia, na cadeira de número
26, que possui como patrono Viriato Correia, concluí que para ter a
responsabilidade de ocupar este lugar, que para mim é uma honra, além de
identificar-me com a Academia, deveria conhecer o patrono, através das suas
obras e ideias, e, me sentir identificado com ele.
Confesso
que, pelo fato de por muitos anos eu estar mais afeiçoado às leituras jurídicas
que às leituras de outras obras, não foi fácil a tarefa. Tive que relembrar dos
meus tempos das aulas de literatura no colégio Marista de São Luís, além das
minhas aulas de Português no Grupo Escolar Gomes de Sousa e no Centro
Educacional do Maranhão, ambos em Itapecuru-Mirim.
De
começo, percebi estar entrando em um terreno bem distinto daqueles que transito
nas minhas experiências diárias, e admito que a inércia me fez andar a passos
bem lentos.
O
certo é que não foi fácil o início da recapitulação. Não pensei em desistir,
pois isto normalmente não faz parte do meu perfil e preferi seguir adiante e,
mesmo em andar vagaroso, decidi continuar. Lembrei-me de uma frase de Martin
Luther King, que dizia: “Se não puder voar, corra. Se não puder correr, ande.
Se não puder andar, rasteje, mas continue em frente de qualquer jeito”.
E
eu segui em frente. Senti-me novamente um estudante da época dos antigos
primários, ginásios e científicos. Parafraseando o livro bíblico Gênesis,
contemplei várias obras literárias do imortal Viriato Correia, mas sem saber,
ainda, se aquilo era bom ou ruim.
O
certo é que decidi conhecer a fundo o grande dramaturgo Manuel Viriato Correia
Baima do Lago Filho, para cumprir duas metas por mim estabelecidas em relação
ao patrono da cadeira que agora ocuparei: conhecer o grande escritor e
sentir-me identificado com ele. Achava que a segunda parte da meta não seria de
tão simples execução.
Inicialmente,
busquei informações bibliográficas sobre o patrono da cadeira e verifiquei que
Viriato Correia, nascido em Pirapemas no Maranhão, foi precoce e começou a
escrever aos 16 anos os seus primeiros contos e poesias. Atuava em vários
setores do conhecimento, das artes e da política, pois era bacharel em direito,
foi deputado federal, e deputado estadual. Além disso, foi jornalista,
contista, romancista, teatrólogo, autor de literatura infantil e de crônicas
históricas e foi professor de teatro.
Viriato
Correia foi membro da Academia Brasileira de Letras. É patrono da Academia
Ludovicense de Letras e foi fundador da cadeira 33 da Academia Maranhense de
Letras.
Foi autor de diversas crônicas históricas, tais como
Terra de Santa Cruz, Histórias da nossa história, Brasil dos meus avós, Alcovas
da História, Balaiada, entre tantas outras obras.
Foi autor de aproximadamente trinta peças de teatro.
Foi autor, também, de numerosas obras literárias
infantis, entre elas História do Brasil para crianças e Cazuza.
Com
estas consultas, verifiquei informações objetivas a respeito de Viriato Correia,
muitas datas, muitos nomes de livros, peças de teatro, que obviamente são
importantes, e que me fizeram cumprir a primeira etapa da minha meta de
conhecer o autor, mas, que, por si só, não foram suficientes para despertar o
interesse pelo acadêmico da forma como eu desejava, pois sabia que, certamente,
este grande acadêmico tinha algo mais a oferecer, além do que eu lia nas
biografias quase catalográficas pesquisadas.
Mas,
seguindo o conselho do grande poeta Gonçalves Dias de que “a vida é luta
renhida...que os fracos abate...” continuei a minha saga em busca da resposta à
pergunta, “quem foi Viriato Correia”?
Prosseguindo
nas minhas pesquisas, identifiquei-me com algo que li sobre a maneira de
Viriato Correia ensinar história em seus livros. Ele se preocupava em contar os fatos históricos de uma maneira
lúdica e atraente, sem se preocupar muito com datas e nomes, comentando algumas
vezes que ‘criança somente se interessa por aquilo que é vistoso’. E
ouso acrescentar que muitos adultos também. Viriato Correia ajudou a vulgarizar
a história, no sentido de torná-la popular. Considerava que o ensino desta
disciplina tinha que ser agradável e entendido por todos. O historiador deveria
ser, segundo ele, antes de tudo, um contador de histórias.
Isto para mim foi algo
extremamente importante, foi a adoção, ainda nos anos 30, da democratização da
cultura e do conhecimento. Foi o entendimento de que a principal missão de quem
possui o saber é a divulgação deste saber, pois o conhecimento, como força
capaz de modificar vidas e mudar o mundo, não pode ficar isolado em grupos de
iniciados. A obrigação de quem adquire o conhecimento é o compartilhamento do
saber e para que este saber seja difundido é necessária a sua popularização de
forma agradável e de um modo que seja entendido por todos. Talvez daí a extrema
dedicação do acadêmico à literatura infanto juvenil, com pelo menos dezoito
obras com esta temática. Viriato Correia sabia da necessidade de transmissão do
conhecimento às crianças e adolescentes como uma das principais formas de
educar um país. E acho que o trabalho da Academia, como difusora de
conhecimentos, não pode passar longe deste pensamento do grande escritor. A
academia deve aproximar-se da comunidade e mostrar a sua utilidade.
Posteriormente, verifiquei o
tom de crítica social em uma das obras mais conhecidas de Viriato Correia,
denominada Cazuza. Esta obra me cativou por vários motivos. Ela trata da
infância do autor na cidade de Pirapemas, e alguns dos fatos ali narrados
fizeram recordar a minha infância nesta cidade de Itapecuru-Mirim. Lembrei-me
do antigo Grupo Escolar Gomes de Sousa, em uma época em que estudavam na mesma
sala de aula os filhos do médico, da faxineira, da professora, do prefeito da
cidade, do gerente do Banco do Brasil e do senhor que vendia laranjas na praça.
Não se fazendo diferença entre as crianças, visto que o tratamento concedido a
todos era igual.
Aprendi a conviver com as
diferenças ali naquela escola, e passei a entender que todos devem ser tratados
de forma igual, independentemente de qualquer diferença de origem, situação
financeira, sexo, etc.
Finalizarei as minhas breves
palavras fazendo uma analogia entre meu estado de espírito neste momento e um
discurso de Viriato Correia proferido em uma Conferência realizada na Federação
Espírita Brasileira.
No discurso mencionado, Viriato
Correia, para narrar a sua mudança do ateísmo para o Cristianismo, e mais
especificamente, para o Espiritismo, conta uma fábula que apresentarei em
resumo.
Na fábula, contada por Viriato,
é narrada a história de um coelho, que nasceu e viveu em uma gruta a existência
quase inteira, e que, por ser orgulhoso, era tomado como rei pelos seus pares,
sendo servido pelos outros coelhos com água, alimentação e todas as outras suas
necessidades. Aquela gruta era para ele tudo, pois ali ele tinha o domínio
completo da situação. Os demais companheiros convidavam-no para sair da gruta,
mas ele relutava, pois naquele refúgio ele se sentia bem, sentia-se grande na
estreiteza daquele local. Não queria sair dali, satisfazia-se em viver daquela
forma, naquela indolência. Não importava para ele a notícia de um mundo imenso
do lado externo.
Mas, certa vez, sentiu fome e
sede, e nenhum dos demais coelhos levaram alimentação e água para ele, e a fome
e a sede foram aumentando e não conseguia mais alimento e água na gruta em que
estava enclausurado por vontade própria.
Pela primeira vez sentiu a
necessidade de mexer-se, de sair do local em que habitava, e, resolveu transpor
a porta da gruta. Seu coração bateu de forma afoita e uma golfada de luz
ofuscou-lhe os olhos e ele parou deslumbrado, com toda a sua emotividade em
êxtase, era a claridade fulgurante da manhã, em que o sol rasgava o céu em uma
esplêndida explosão de rosa e ouro. A natureza inteira despertava cantando,
pássaros voavam e tudo brilhava numa apoteose de maravilhamento.
Aquela situação de imensidade
levantou a vida do coelho, que ficou extático, maravilhado, olhando tudo, com
uma deliciosa sensação de luz e a impressão do grande infinito. Se sentia
grande na sua toca, mas agora se sentia pequenino. Era onipotente em sua gruta,
era o senhor. Lá fora não era mais. Mas, apesar de tudo, não queria voltar para
a sua antiga toca.
Preferiu sair da sua
comodidade, onde havia sempre alimento, água e tudo que achava que precisava, e
optou ficar diante daquele panorama de luz, daquele radiante cenário de
grandeza, daquela claridade que lhe tonificava a vida e nunca mais voltou à
escuridão da caverna.
Após a leitura do discurso do
grande acadêmico Viriato Correia, identifiquei-me imediatamente com a fábula
contada.
Eu estava acomodado com a minha
vida de aplicador do Direito, no meu trabalho que me dá uma grande satisfação,
pois sou feliz nas minhas atividades. Não tinha grandes ambições de mudança,
exceto, talvez, profissionais.
Desde há alguns anos amigos
desta Academia, muitos deles aqui presentes nesta noite, sugeriam meu nome para
compor esta ilustre entidade. Rejeitei diversos convites, não por não
reconhecer a importância da entidade, pois já a reconheço há muito tempo, mas
por estar na minha gruta, feliz, acreditando que com minhas necessidades
satisfeitas, não havia porque modificar a minha situação, e sempre encontrando
uma ou várias desculpas para não aceitar o sodalício.
Na verdade, eu ainda não tinha
saído da minha toca para ver as novas luzes que se apresentavam para mim, tal
qual a fábula contada.
Resolvi sair do meu refúgio e
transpor a gruta que me abrigava. Quanta surpresa me esperava, conheci o
trabalho quase incansável de muitos dos integrantes desta Academia. O trabalho
de difusão de cultura, de democratização do saber, de não permitir que o
conhecimento ficasse restrito nas mãos de poucos, pois como consta no Livro Bíblico
dos Provérbios: “o homem sábio é forte, e o homem de conhecimento consolida a
força”. Verifiquei a consolidação dessa
força através das mãos de acadêmicos, que exercem as suas atividades tendo como
contraprestação dos seus atos a satisfação nos olhos daqueles que recebem o
conhecimento.
Saindo da minha estreiteza de
pensamento, que era um antigo refúgio, minha visão abriu-se para novas
possibilidades, um novo sol surgiu em minha alma, uma nova chama está ardendo
em meu peito. A chama da necessidade de participar desta distribuição de
conhecimento e cultura.
E assim, como o personagem da
fábula contada por Viriato Correia, não desejo mais voltar à minha antiga
condição, rejeitei a minha situação anterior de comodidade e satisfação que
entendia ser completa para aderir ao sodalício da Academia Itapecuruense de
Ciências, Letras e Artes, para combater o bom combate, como falou certa vez o
apóstolo Paulo.
Muito obrigado.
*Maurel Mamede Selares, Itapecuruense, Procurador
do Ministério
Público do Trabalho, do Maranhão, tomou posse no dia 19 de outubro do corrente
ano para a cadeira 26, da Academia
Itapecuruense de Ciências, Letras e Artes, patroneada por Viriato Correa.
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