João
Carlos Pimentel Cantanhede
Raimundinha e Izabel estavam
conversando quando, de repente, começaram a ouvir uma música contagiante. Era o
som da Discoteca 404, na Rua Benedito
Bráulio Mendes, que começava a tocar os primeiros embalos naquela noite de sexta-feira.
Izabel vira para Raimundinha
e fala: – Vamos lá?!
– Eu não! Depois mamãe
descobre, vai ser taca na certa! – respondeu Raimundinha com jeito de quem
queria ir, mas estava com medo.
– Deixa de ser besta, nós
vamos lá rapidinho que ela nem vai descobrir!
Com muito jeito, Izabel
acabou convencendo Raimundinha.
– Mamãe nós vamos ali, mas
não demoramos!
– Vão, mas nem pensem em me
enganar! Se eu souber que vocês foram
pra discoteca, já sabem, vão dormir na rua, porque eu não vou abrir a porta
meia noite pra ninguém! E amanhã a taca estará garantida.
– Não é nada disso, senhora,
nós vamos só conversar um pouco com Bazinha. – respondeu Izabel tentando
enganar Tinoca.
A discoteca funcionava de
quinta a domingo. Era a diversão dos jovens e uma perturbação para os mais
velhos. Seu Isidoro que morava na Rua Urbano Santos, de fundos para essa casa
de festas, a chamava de “Inferno verde”.
Tinoca, nem se fala,
detestava a discoteca porque Izabel e Raimundinha viviam querendo ir lá toda
semana. Naquela noite, ela pensou:
“Eu vou pregar uma peça
nessas meninas! ”
Anos antes, Tinoca ficou
muito doente e fez uma promessa para São Benedito. Com a obtenção da graça, ela
pagou a promessa usando uma mortalha branca no festejo desse Santo, na Matriz
de Nossa Senhora das Dores. Essa mortalha ela guardava dentro de um baú para
lhe servir de última vestimenta.
Passado algum tempo depois
que as meninas saíram, Tinoca abriu o seu velho baú, pegou a mortalha, vestiu e
ficou estirada em cima da cama, fingindo estar morta.
Enquanto isso, na discoteca,
Raimundinha e Izabel se requebravam ao som de “Take me home” de Cher. Ambas
vestidas com blusas brancas para receberem o efeito das luzes do globo que
girava no teto. Todo mundo ia de branco e dançava como se fosse John Travolta e Karen Lynn Gorney no filme
Saturday Night Fever.
Raimundinha puxou Izabel
pelo braço e falou que era hora de voltarem para casa. Quando chegaram, foi
dito e feito, a porta da rua estava fechada. Elas pularam o muro e conseguiram
abrir uma janela nos fundos da casa. Tiraram as sandálias e foram andando nas
pontas dos pés para não acordarem Tinoca.
Tudo transcorria bem, Izabel
foi para o seu quarto. Raimundinha como dormia com a sua mãe, tinha que ser
mais cuidadosa. Só que ao abrir a porta do quarto, viu Tinoca vestida na
mortalha. Levou um susto e correu para chamar Izabel.
– Mamãe morreu!
– Deixa de conversa, menina!
– É verdade! Ela tá vestida
com a mortalha lá na cama.
Izabel foi devagarinho, se
aproximou de Tinoca e percebeu a farsa da sua mãe. Chamou Raimundinha e disse:
– Ela tá só fingindo, sua
boba! – Izabel disse isso e foi dormir.
Pobre Raimundinha, como
dormia na mesma cama que Tinoca, só deu “pra radiola” dela. Tinoca despertou,
tirou a mortalha e começou uma “ladainha” sem fim. De vez em quando, ela parava
de falar e: – Poc! Poc! Poc! – cascudo
na cabeça de Raimundinha, que nada podia fazer, além de pegar cocorote e ouvir
sermão no pé do ouvido.
Uma crônica do cotidiano itapecuruense. Era bem assim à minha época. Os cocorotes corriam soltos.
ResponderExcluirParabéns ao autor!
Uma crônica do cotidiano itapecuruense. Era bem assim à minha época. Os cocorotes corriam soltos.
ResponderExcluirParabéns ao autor!
Obrigado, Benedita. Seus comentários servem de incentivo para meus singelos textos.
ResponderExcluirabraços, João Carlos
Izabel com suas ideias e Raimundinha pagando "o pato"... rsrs
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