Por:
Daniel Ribeiro *Conto
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Nascido para os lados do Ceará, - contava vovó Noca. É isso criançada o que sei da origem do Negro
Cosme. Pedro e Bia se entreolharam após a contação da estória que seu Joaquim Caçareiro
viu-se aperreado para destrinchar, - mas pensávamos que ele era maranhense,
Bia.
Pedro
e Bia brincavam na praça do mercado quando encontraram uma pedra antiga com as
inicias de Cosme Bento das Chagas, com a data da execução do líder da maior
Insurreição de escravos do Brasil-Império. Então, ao deparar-se com aquele
legado inestimável, Bia sempre mais esperta que seu amigo, correu em direção à
antiga quitanda localizada no prédio do mercado municipal, ali onde meia dúzia
de homens de aparência idosa jogavam dominó todas as tardes, e seu proprietário
preparava mais uma rede de pesca. Seu Joaquim Caçareiro foi enfático com a
menina, todas as pessoas que contavam a história do Negro Cosme, era sempre
pela ótica do opressor nunca dos oprimidos que lutaram pela libertação, por
isso, - o que vou narrar para vocês contrariam os livros de história.
Um
negro forte, alto, robusto e de boa aparência chegou da província do Ceará,
subiu o Rio Parnaíba em direção a Comarca de Brejo. A princípio parecia
conhecer bem essas brenhas, pelos quais andavam aqueles que sorrateiramente queriam
viver longe dos olhares das autoridades. Desde cedo, fora acolhido por seus
irmãos, pois, quem fosse preto descendente d’Àfrica fazia parte dessa irmandade
natural dos escravos, filhos de escravos, quilombolas filhos do continente mãe
de todos os povos. O certo é que logo, consolidou-se como uma espécie de líder quase
espiritual de um batalhão de homens que arregimentava, por onde passava com
seus ideais de liberdade contagiante, a quem o escutasse.
Para os braços-de-ferro da província do
Maranhão era uma ameaça um Negro ter tamanha audácia de formar um exército
contra as forças provincianas. Os
brancos começavam a inquieta-se com as notícias das fazendas rendidas, e os
rumores da libertação dos escravos para o lado da Lagoa Amarela, tão logo
chegaram aos ouvidos dos barões, que os insurgentes subiam em direção ao Rio
Preto na confluência do Munim com o Iguará.
Alguns o consideravam de uma visão
progressista, como pode um homem preto por essas bandas fundar uma escola no
tempo em que o Brasil Imperial priorizava o ensino apenas para os aristocratas,
contrariando todas as leis gerais no Quilombo Lagoa Amarela, uma escola havia
sido levantada no meio do cerrado, longe de tudo, em meio a guerra. A liberdade
sonhada por Cosme estava além do viés estabelecido pelo limite do sistema
escravocrata, dá o direito aos seus pares de ter acesso à educação era,
sobretudo, garantir o livre-arbítrio da alma.
Cosme, era dotado de uma capacidade
que o distinguia dos outros pretos, sabia ler e escrever, assim, foi confirmado
nas cartas de liberdade dada a vários escravos na localidade Oiteiro, possuía
inclusive um secretário, um português que fora caixeiro lavrava com sua
caligrafia os decretos, do Tutor e Imperador da Liberdade como se auto
intitulava. Durante tal período por
vezes seu esquadrão que chegara a três mil homens passou a ser confundido com a
revolta dos brancos a Balaiada, todavia, as causas eram outras, lutava-se
contra o império e contra os escravocratas não havia como unificar uma luta que
não primasse pelo alvedrio.
-
Vó Noca, citava também, uma tal República dos Negros. - Joaquim Caçareiro.
Sonhada
pelo líder da Insurreição, ela não soubera explicar porque sua leitura era
pouca. O que sabemos é que essa batalha se estendera pelos municípios de
Caxias, Codó e Itapecuru, agora imaginemos que esses municípios eram enormes,
tendo em vista, que nos dias atuais foram desmembrados e deram origem a várias
outras cidades. O interior da província tinha sido tomado por uma revolta sem
precedentes de homens da raça do preto Cosme, líder que dera a própria vida em
defesa de seus irmãos cativos, revolucionário para os homens de cor, facínora e
bandido para os que escreveram a história defendendo os seus interesses.
Os
ventos de liberdade que sopravam do Haiti percorreram a América e inspiraram os
negros do Maranhão, se na ex-colônia francesa Toussaint L´Ouverture comandava
os negros para maior revolução de escravos do Novo Mundo, na Ribeira do Itapecuru
pisara Dom Cosme Bento das Chagas com seu imponente exército de insurgentes, que
em sua maioria era composto de negros
forros, escravos e quilombolas; ecoava às margens do Rio Itapecuru o grito de
liberdade, tantas vezes, silenciado pelos senhores de escravos que outrora
dominavam essas terras, restando o legado do maior território quilombola do
estado do Maranhão.
Os
gritos de viva a liberdade, ainda confundem-se com o eco de injustiça que permeia
o palco da Insurreição, dada a falta de memória do herói de nossa gente, tantas
vezes, executado quando apenas é retratado do ponto de vista do opressor que
não enxerga em Cosme o arauto da história do Maranhão e do povo Negro.
Pedro
e Bia extasiados com tamanha importância de Dom Cosme, nunca mais deixariam
morrer a memória de um herói, esculpido como o bandido, facínora e feiticeiro,
o anti-herói seria lembrado como o Imperador da Liberdade. A desconstrução da
imagem negativa criada pelos senhores do poder, tinha agora em seus novos
seguidores, a missão de levar aos quatros cantos da cidade de Itapecuru e do
Maranhão, que este solo foi lavrado com o sangue dos homens e mulheres que
deram a vida em nome dos ideais de liberdade, fraternidade e igualdade.
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