terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

EU SOU DO TEMPO EM QUE…



Por: Benedito Buzar

            Na semana passada, mudei de idade. Sou um setentão assumido e bem conservado, daí porque não me queixo da vida. Ao chegar aonde cheguei, devo dizer que ora caminhei por estradas pedregosas, ora por vias bem pavimentadas, estas, felizmente, bem mais numerosas do que as outras. Também passei por dissabores, que os considero insignificantes e desprezíveis quando os comparo e os contabilizo com as venturas, os sucessos e as alegrias acumuladas e vividas, sem esquecer a família que construí e os amigos que me cercam.
Concordo com o escritor mineiro Pedro Nava quando disse que a vida é um carro andando numa estrada com as luzes traseiras ligadas. Assim é a minha vida. As luzes que a iluminam estão sempre bem acesas para que a escuridão não atropele os meus passos, que embora curtos e modestos, sempre me levaram ao caminho do bem.
            Nesse percurso em busca da felicidade e de fazer o bem, não esqueço o meu passado, do qual, sem ser saudosista, tenho saudade de tantas coisas boas que presenciei e desfrutei, que recordo, lembro e não saem da minha memória,  e agora recorro para vangloriar-me de que eu sou do tempo em que…
            Só se sabia o sexo da criança depois do parto, quase sempre realizado em casa, mas sob a assistência das benditas parteiras. A minha chamava-se Agostinha
            Chupeta se chamava pipo e tênis (calçado) tinha o engraçado nome de chulipa.
Filho não sentava à mesa antes dos pais, cujas refeições diárias eram  preparadas em fogões movidos a lenha ou em fogareiro e carvão. Aos domingos, não se dispensava o almoço-ajantarado.
            Meninos e meninas dormiam de chambre e não se deitavam sem antes rezar e serem abençoados pelos pais. Para o descanso noturno, não se dispensava a rede, debaixo da qual não podia faltar o penico ou urinol.
            O local onde se fazia as necessidades fisiológicas chamava-se sentina, instalada estrategicamente no fundo do quintal da casa.
            As mulheres usavam peças íntimas chamadas sunga, corpete e anágua e os homens ceroulas e cuecas samba-canção.
            No verão, um calçado de madeira era usado em larga escala por homens e mulheres: tamanco ou chamató. No inverno, as galochas, produtos de borracha, protegiam os pés e sapatos.
            As roupas masculinas eram feitas por alfaiates e as femininas por costureiras.
            Caligrafia e tabuada eram livros obrigatórios no curso primário e os professores dos cursos secundários davam aulas de terno e gravata.
As famílias sentavam nas portas das casas para as habituais conversas de finais de tardes.
            O castigo físico era um procedimento natural para corrigir filhos, sendo a palmatória o instrumento preferido para fazê-los entrar na linha.
            Gripe se chamava constipação e curava-se com remédio caseiro à base de agrião e mel, sob a forma de xarope.
            Carne, peixe e frango se compravam em mercados; gêneros de primeira necessidade em mercearias e quitandas.
            As fardas colegiais eram feitas de tecidos grossos, do tipo cáqui ou brim.
            Os homens só cortavam cabelo com barbeiros e as mulheres gostavam de um penteado chamado permanente.
            Festas dançantes, em clubes, eram animadas por orquestras. Em residências particulares, por radiolas ou toca-discos, que funcionavam à base de discos vinil.
            Defuntos eram velados em residências e a roupa preta era sinal de luto.
Calcigenol, Biotônico Fontoura, Emulsão de Scott, Melhoral, Pomada Minâncora, Anaseptil, Phimatosan, Elixir Xavier, Bicabornato de Sódio, Pílulas de Vida do Dr. Ross, Bromil, Leite de Magnésia Philips, Elixir de Inhame Goulart, Ozonil, Cibazol e Coramina eram remédios mais procurados nas farmácias.
            Sabonetes Phebo, Eucalol e Lever; pasta dental Kolinos e Philips; óleo de cabelo Glostora; talco Gessy, perfumes Regina, desodorantes Leite de Rosas ou Leite de Colônia, eram produtos de uso pessoais mais consumidos.
            Padres usavam batina preta, celebravam os ofícios religiosos em latim e de costas para os fiéis. Ninguém comungava sem antes confessar os pecados aos padres.
            Jogo de futebol era chamado match. Quem jogava no gol era keeper; na defesa, back; na intermediária, half; centro avante, center ford ward. Juiz da partida, referee.
            Automóveis de passageiros eram conhecidos por carros de praça e o ato de levá-los para algum lugar chamava-se corrida.
            Wisky era bebida de rico. Cerveja, cinzano, vermute e conhaque, da classe média; cachaça, dos menos aquinhoados.
            Mulheres do baixo meretrício, respondiam pelos nomes de prostitutas, raparigas, mariposas, gatos. Homem que não pagava mulher depois do ato sexual chamava-se xexeiro.
            Zica era uma famosa dona de pensão de raparigas da Rua 28 de Julho.


2 comentários:

  1. Bravo, muita criatividade! O uso dos termos bem colocados em cada situação do cotidiano daquele tempo, que também foi o meu tempo. A cônica que eu gostaria de ter escrito. Parabéns!

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