segunda-feira, 22 de junho de 2020

TÚNEIS INVISÍVEIS

   *César Borralho

Quando algo ascende à chama ainda
rosna a fera a tudo o que hiberna,
a boca que era farta se dá faminta,
devorando todas as quimeras. 

Não existem flores na primavera,
só segundas intenções. 

O pouco que outrora acalmava,
(um dia) desespera! 

O vento se torna o faro do lupino,
o pássaro atrai a pedra do menino
e tudo tem a sede de um carnívoro. 

A memória é zona de conflito,
intersecção de túneis inundados,
submarino atroz, desgovernado que
não protege a própria carenagem. 

Todo esforço é luta aflita do selvagem
para desacreditar das coisas do silêncio.  

À coragem só existe o movimento
contra a certeza e tudo o que ela crê
atenta ao que causa a inquietude,
alheia ao que esta causa ao ser.

Emperrar as engrenagens do silêncio
é transcender o calor do útero estéril,
exceder o puerpério e contrair a calmaria.

A ama de leite amamenta o futuro
em plena agonia, a mama esquerda
dá leite, a direita - epilepsia.   

É preciso quebrar gavetas de ouro,
panificar com fermento tibetano
incontáveis tesouros africanos e
conter toda hemorragia.

Não é o sol que vira as páginas do dia,
mas tão-somente aquilo que amamos.


 *Sou César Borralho, natural de Codó (MA), 1979, porém, vivo em São Luís do Maranhão desde 1979. Sou professor, mestre em Cultura e Sociedade, especialista em Filosofia da Arte e graduado em Filosofia. Escrever poesia é dar ritmo às imagens que crio na eterna luta para que o papel não fique obscuro e nem tão vazio. Poesia é o vento que leva o barco quando barco não há. Nunca aspirei publicar um livro para me tornar poeta, mas se um dia me tornar poeta, publicarei um livro.

8 comentários:

  1. Linda e forte, meu amigo! Traz no recheio as dores do tempo presente mas, ao final, cobre de esperança o q faz nascer um novo dia: o amor. Parabéns!

    ResponderExcluir
  2. Palavras são mudas diante de tanta sensibilidade... intransponível dizer o que sinto ao navegar nesse canto que brota de ti...amigo amado...

    ResponderExcluir